Sobre a Feira do Livro de Erechim

É dia de feira
Quarta-feira, Sexta-feira
Não importa a feira
É dia de feira
Quem quiser pode chegar

“A Feira”, O Rappa

I

Vivemos mais uma Feira do Livro de Erechim. A 19ª edição da Feira voltou a ser realizada em um local público, em uma praça. Aplausos! Os livros e as atividades culturais do evento precisam estar visíveis na cidade, não podem se esconder num cantinho de um outro evento ou em um prédio que não convida a ser frequentado. A Feira voltou à praça, ainda que podendo ser mais Feira do que foi mais uma vez.

II

Por isso, importa a Feira sim! Não podemos fazer um evento por fazer. Desde que acompanho a Feira do Livro de Erechim tenho um sentimento de que o evento não está à altura do lugar de nossa cidade como pólo educacional. E uma questão estrutural permanece: faltam livros! Exatamente isso: nossa Feira é muito pobre em livros, em opções nos variados gêneros. Orgulha os(as) erechinenses nossos indicadores educacionais, mas nosso município não tem espaços culturais de relevo, ainda tem uma agenda muito incipiente de atividades artísticas e estamos, até por questões demográficas e de localização, fora das turnês dos grandes espetáculos e shows. É exatamente por isso que a Feira do Livro deveria ser um espaço especial da cidade, potencializando a formação de novos(as) leitores(as) sensíveis à poesia, à música, ao romance.

III

Quem passou pela Praça Jayme Lago nos dias da Feira não viu o pessoal aqui da cidade expondo os livros. Pautada pela lógica de mercado, na qual os números ($) vêm antes das pessoas, a Prefeitura Municipal resolveu cobrar uma taxa absurda para os padrões locais, inviabilizando a participação de nossos(as) bravos(as) livreiros(as), que mantêm algumas opções de livrarias (algumas mais papelarias) numa cidade em que a voltinha de carro pela Avenida central é mais importante do que a leitura de um livro. Não aprendemos a exibir livros, mas carros! E essa lógica nefasta é incentivada por essa medida do poder público em cobrar dos(as) expositores(as). Que a taxa, se fosse de necessidade extrema, tivesse sido revertida em livros para a nossa biblioteca pública ou às bibliotecas das escolas municipais. Já pensaram: a “moeda” da Feira seria o livro!

IV

Mesmo entre poucas opções, gostei de caminhar pela Praça entre os livros que lá estavam. Gostei de encontrar em todas as vezes que estive na Feira a sua patronesse, a querida professora Neide Piran. Foi legal ter uma cafeteria, assim como reencontrar o suco de laranja natural da agricultura familiar que nos acompanhava nos tempos da UFFS no Seminário Fátima. Gostei da “alameda das universidades”: URI, UERGS, FAE, UFFS. Mas, me intriguei ao não ver o nosso IFRS. O que explica a ausência do IFRS da Feira?

V

A estrutura da Feira estava bem interessante. Claro, sempre quando os dias estão chuvosos, os(as) livreiros(as) sofrem um pouco para proteger as estrelas do evento (os livros, não os convidados “famosos”, muito menos os empresários que falam de educação como se estivessem falando de um produto qualquer…). O palco da Praça Jayme Lago foi ponto estratégico e foi muito bem usado para palestras e apresentações culturais diversas. Contudo, nada mais lógico em uma Feira com poucos livros a ausência de um local específico para autógrafos. Uma Feira do Livro sem praça de autógrafos é quase como um campo de futebol sem goleiras. O Fabrício Carpinejar, depois de uma fala cheia de estereótipos de gênero e sacadas geniais (gosto mais de ler do que de escutar ele) autografou livros de pé, encostado no palco da Praça. Que feio para nossa “capital da amizade”.

VI

A programação de debates, palestras e oficinas também mobilizou a Feira. Vários temas foram objeto de debate, mostrando que há crescente interesse em questões relativas à cultura, economia, política, religião etc. As salas programadas para a realização dessas atividades foram uma boa iniciativa. Quem sabe um trabalho mais próximo de escolas e universidades pudesse redundar em uma programação mais robusta, com mais espaços de discussão e, até mesmo, apresentação de produções científicas. Uma exposição de banners poderia ser uma sugestão. Claro, sem cobrança de taxa!

VII

Eu comprei apenas um livro na Feira: “A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato”, do sociólogo Jessé Souza. No estande em que adquiri esta obra, a retirei do lado de um livro sobre o deputado Bolsonaro, que é apreciado por parte de nossa comunidade erechinense. E a Feira deve ser isso: um espaço plural, aberto, amplo, convidativo ao bate papo, à resenha, ao encontro. Talvez faltaram lugares para que as pessoas se encontrassem. Falo em geral, pois as “panelinhas” estavam bem representadas na Praça, em suas sociedades e clubes. Ou alguém se sente convidado(a) a ir no estande da nossa Academia Erechinense de Letras? Aliás, quem sabe o que faz ou quem faz parte desta entidade? Vou ajudar divulgando o site (https://ael-erechim.org.br/).

VIII

Tenho refletido sobre a Feira do Livro há algum tempo. Tenho críticas construtivas e sempre me coloco à disposição para contribuir no que for possível. Entreguei meu contato em mãos da secretária da educação. Claro que tem gente mais capacitada do que eu para construir a Feira, mas, então, se apresentem! Erechim tem que pensar grande, somos uma cidade que entrou no mapa educacional do país, temos grandes universidades e boas escolas públicas e privadas. Não podemos naturalizar a ideia de que a nossa Feira do Livro é um espaço medíocre. Nada disso! Uma cidade que organiza um Rally Internacional e uma Copa do Mundo de Futsal pode mais. Tenho esperança que no ano que vem teremos uma Feira com livros e muitas atrações e “quem quiser pode chegar”, afinal, a Feira é da cidade!

Por Thiago Ingrassia Pereira/ UFFS

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