SEMENTE DO AMANHÃ

Março é um mês comum no Brasil, o outono começa, comemoramos o dia das mulheres. Por aqui costumamos dizer que o ano se inicia, afinal, o Carnaval acaba. O mês, no geral, é uma sequência de dias. Nesse ano está sendo bem diferente, pois o ano, ao invés de começar, parou. O vírus chamado novo Coronavírus que iniciou na China em dezembro e de lá, através da movimentação humana, tem se espalhado para o Planeta Terra, chegando ao Brasil em março e também em outros países.

O Coronavírus trouxe com ele a ameaça à vida, nosso temor maior agora é real e pode acontecer conosco e com os que amamos. A morte é notícia diária. O vírus mata, esse é o recado, que por vezes não queremos entender e aceitar, negamos.

A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é que se fique em casa e que se saia à rua somente em caso de extrema necessidade e só os serviços essenciais se mantenham trabalhando, os demais precisam ser fechados.

Essas exigências requerem mudanças de comportamento e somos naturalmente reativos as ordens e isso coloca em risco a vida humana. Agora mais do que nunca todos dependem de todos. É assustador e tão desafiador, pois não temos essa cultura de nos importarmos com o outro e de dependermos do outro. Somos individualistas, uma ilha.

Trancados em nossas casas (quem pode) sentimos medo, ansiedade, tristeza, preocupação que se avolumam pela enxurrada de informações pela televisão, WhatsApp, Facebook, redes sociais, notícias falsas, pronunciamentos contra a ciência e impressa, decretos que são emitidos e depois revogados, estatísticas que se elevam a cada dia, propagação da doença diariamente, previsões econômicas desastrosas para todos, etc… O cenário é assustador e temeroso.

A palavra da vez é resiliência que é propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica. Traduzindo: é a nossa capacidade de vergar e não quebrar.

Diante do quadro da dor com a moldura do desespero, nossa reclusão forçada pelas autoridades para proteger nossas vidas e dos demais, recomendo que encontremos no que gostamos de fazer as forças internas para seguirmos em frente, seja no livro não lido, em revisitar um filme que amamos ou assistindo outros, lendo uma poesia, ouvindo músicas, ligando para quem amamos, desligando celular e televisão, cuidando de suas plantas, tricotando, crochetando, voltar a conversar, contar histórias, escrever, brincar com os filhos…. Enfim, as opções são muitas. Usem suas mãos para tirar de dentro a angustia e colocar para fora através da arte.

E neste sentido divido uma pequena/grande música de Gonzaguinha e que pode nos ajudar a passar os momentos sombrios que vivenciamos, sem esquecer que tudo passa e que precisamos continuar acreditando na capacidade que temos de nos reinventar a cada dia.

“Ontem o menino que brincava me falou
Que hoje é semente do amanhã
Para não ter medo que esse tempo vai passar
Não se desespere não, nem pare de sonhar
Nunca se entregue, nasça sempre com as manhãs
Deixe a luz do sol brilhar no céu do seu olhar
Fé na vida, fé no homem, fé no que virá
Nós podemos tudo
Nós podemos mais
Vamos lá fazer o que será”.

A poesia dessa música é um consolo diante da ameaça que estamos vivendo. Para alguns apenas uma ameaça da vida e para outros da vida se despedem. É lamentável. Aproveite a vida, ela é breve e não sabemos quando ela poderá terminar, mas ela acabará.

A esperança no amanhã deve nos mover mesmo sabendo que será complicado. Podemos contar uns com os outros? Eu espero que sim, nossa única saída para fazer um amanhã melhor que hoje e seguindo tendo “Fé na vida, fé no homem, fé no que virá”. Alimente sua fé renovando forças para enfrentar o que vier.

Maria Emília Bottini

Psicóloga clínica

Mestre em Educação pela Universidade de Passo Fundo (UPF)

Doutora em Educação pela Universidade de Brasília (UnB)

Autora do livro No cinema e na vida: a difícil arte de aprender a morrer

E-mail: emilia.bottini@gmail.com

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