Eleições, Copa do Mundo e o Brasil visto do outro lado do oceano

I – As últimas semanas foram intensas no Brasil, o que deve permanecer até outubro próximo. As eleições começaram a tomar corpo com a definição dos pré-candidatos aos cargos executivos e legislativos, ao passo que a Copa do Mundo teve o seu pontapé inicial, levando diversão e esperança aos amantes do futebol no país. A cada quatro anos temos uma Copa do Mundo antecedendo o período eleitoral mais importante da nossa democracia, que envolve a escolha do presidente da republica, governadores, senadores e deputados federais e estaduais. Vale lembrar que isso ocorre desde 1994, quando casualmente a seleção brasileira de futebol se sagrou tetracampeã mundial e Fernando Henrique Cardoso foi eleito para o seu primeiro mandato presidencial. No que diz respeito a mim, pela primeira vez na vida, estou acompanhando esses dois eventos a distância, sem vivenciar o clima que ambos produzem no nosso país. É claro que isso não me torna um brasileiro desinteressado, muito pelo contrário. Julgo que as eleições desse ano serão decisivas para (re)definir o país que queremos, e se ele seguirá o caminho da estagnação e da exclusão imposto pelo atual governo ou se optaremos por um projeto nacional de desenvolvimento includente. Por outro lado, torço para que a seleção brasileira obtenha um resultado capaz de apagar o vexame da última Copa do Mundo, o que talvez só seja possível com a conquista da taça de campeão. Mesmo atento ao que se passa no Brasil, tenho refletido sobre a experiência de acompanhar as eleições e a Copa do Mundo do lado de cá do Oceano Atlântico. Mas afinal, o que que muda no olhar e no sentimento de quem está fora do país?

II – O primeiro aspecto que merece ser destacado é que, em qualquer país, a imprensa dá prioridade ao noticiário local e àquilo que diz respeito às questões nacionais. Em Portugal isso não é diferente. No que se refere à Copa do Mundo, a imprensa portuguesa está muito mais preocupada com o desempenho de Cristiano Ronaldo e Cia do que com a participação das demais seleções. Aliás, a participação de Portugal na Copa, na condição de atual campeão europeu de seleções, tem levado às ruas um conjunto significativo de bandeiras, camisetas e cachecóis com os símbolos nacionais, bem como revela um desejo confesso de que Portugal finalmente se torne campeão. É claro que as emissoras de rádio e televisão também falam do Brasil, até talvez com um pouco mais de destaque que as demais seleções estrangeiras, devido ao grande número de brasileiros que residem aqui e também por causa da relação histórica entre Portugal e Brasil. No fundo, a verdade é que todo o clima de Copa do Mundo em Portugal, como seria de se esperar, é pró-Portugal, mesmo que nós brasileiros sejamos apaixonados e barulhentos conforme está consagrado nas nossas tradições futebolísticas.

III – Preciso confessar que o fato de estar vivendo a Copa do Mundo no exterior tem potencializado a minha torcida pela seleção brasileira. Nunca fiz parte da turma do “contra”, por isso sempre torci pela seleção brasileira, mesmo em momentos que a configuração dela representava muito pouco o país. Em Coimbra, a comunidade brasileira é grande, sobretudo por causa de grande presença de brasileiros na universidade, e o sentimento de pertencimento nacional anda aflorado entre os brasileiros que residem aqui. No jogo de estréia da seleção a partida foi transmitida em dois telões em praça pública, os mesmos que mostraram o confronto entre Portugal e Espanha dias antes. Também é verdade que muitos portugueses estão torcendo pelo Brasil e para que ocorra uma final entre Brasil e Portugal, claro, de preferência com vitória portuguesa. Conforme me confidenciou um rapaz, repórter de um jornal local, seria maravilhoso para Portugal vencer o Brasil numa eventual final de Copa do Mundo, porque somos os principais campeões do torneio e, de quebra, nossa sensação de derrota seria menor, visto que ocorreria contra Portugal, país irmão (nas palavras do jovem português) e que ainda não possui título dessa natureza. Dito isso, preciso admitir que mesmo distante fisicamente do Brasil estou visceralmente envolvido com o clima da Copa do Mundo, torcendo muito para que o Brasil conquiste o hexacampeonato para o nosso país.

IV – Meu sentimento não é diferente em relação às eleições. O Brasil precisa sair fortalecido desse processo, mesmo que eu também tenha convicção de que os nossos problemas não serão solucionados somente através do voto. Precisamos mais do que isso. Por exemplo, temos que qualificar a participação cidadã em todas as esferas da sociedade, precisamos de uma cidadania ativa que fiscalize o poder público e se coloque no papel de protagonista nas decisões mais importantes. É claro que no caso da política não basta torcer. Eleições e política não são atividades esportivas, até porque o seu resultado tem um forte impacto na vida de todos. Por isso, acompanho com interesse e posição definida o atual processo eleitoral. Entendo que o Brasil não pode retornar ao passado e que o flerte de determinados setores da sociedade brasileira com agentes políticos de discurso e prática autoritária pode nos jogar numa crise ainda mais profunda do que aquela que estamos vivendo. É preciso avançar e, para isso, nada melhor do que um projeto de país que proponha a retomada do desenvolvimento mediante inclusão social. É nisso que acredito e por isso que trabalho, hoje mesmo a distância.

V – Dia desses me dei conta que quando retornar ao Brasil, em fevereiro do próximo ano, vou me deparar com um país diferente, com novo presidente da repúbica e novo congresso. Do mesmo modo, é possível que o Brasil seja hexacampeão mundial. Ficará marcado na minha história que vivi esses dois eventos a distância, pelo menos em termos geográficos. Certamente muitas outras coisas terão mudado. Não é possível ficar um ano longe do nosso lugar sem que ocorra algum grau de estranhamento no retorno. Hoje olho o Brasil do lado de cá e me reconheço cada vez mais nele, na história, na política, na cultura, na música e no também no futebol. Somos um conjunto de coisas e muitas delas dizem respeito não apenas a nós, mas também ao lugar de onde viemos e aos lugares por onde passamos. E como estará Erechim aqui oito meses? Isso também depende em grande medida de como estará o Brasil. Muita coisa se decide ainda em 2018 e nos resta trabalhar e torcer para que seja o melhor.

 

Por Luís Fernando Santos Corrêa da Silva

E-mail: lfscorrea@gmail.com

 

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