Tragédia e mistério no Rio Teixeira

Na tarde do último domingo, 31 de dezembro, o menino Guilherme da Silva Andrade, 12 anos, brincava com a irmã, o irmão, 15 anos, e a namorada deste na beira do Rio Teixeira, divisa entre os municípios de Ipiranga do Sul e Sertão, quando por volta das 15h o garoto mais novo desapareceu nas águas do local. O Corpo de Bombeiros de Passo Fundo foi acionado, realizou buscas, mas o corpo de Guilherme só foi encontrado no final da manhã do dia seguinte, por familiares. Desde o momento do desaparecimento a família relatou que o menino havia sido atacado por uma cobra de grande porte, tendo em torno de 06 a 07 metros de comprimento, e a partir daí o caso ganhou repercussão nacional, levantou dúvidas e mobilizou a Patram (Patrulha Ambiental da Brigada Militar) em uma caçada que já se estende por dias. Entre a certeza de alguns e a incredulidade de outros, até o fechamento desta edição nenhuma cobra havia sido localizada pelas equipes de busca. Seriam verdadeiros os relatos? Mentira? Ilusão de ótica? Alucinação coletiva causada pelo estresse? A existência ou não de tal cobra, talvez permaneça como um mistério no Rio Teixeira. Uma pergunta que somente o tempo consiga responder.

No local

No início da manhã do dia seguinte ao desaparecimento desloquei para o local com o objetivo de buscar maiores esclarecimentos sobre o caso e todas as matérias feitas a partir dali foram construídas baseadas nos depoimentos dos locais. Sobre a ponte da divisa entre os municípios encontrei diversos moradores e familiares, enquanto outros usavam um pequeno barco para procurar a criança desaparecida. Em determinado momento alguém pula na água para auxiliar nas buscas e alguns gritam da ponte. “Sai daí, vai que ela ainda esteja por aí”. Naquele dia, entre outros tantos, conversei com o irmão, a mãe, a avó, o padrasto e com o tio de Guilherme, que foi o primeiro a chegar no local e salvou o irmão mais velho. Na terça-feira (02), acompanhei as buscas pelo animal. Cheguei no início da manhã e saí somente ao final da tarde. Ao lado de policiais da Patram e bombeiros, andei pelas áreas de mata e margens do Teixeira. Também acompanhei a retirada de uma rede que havia sido estendida no rio para evitar que a correnteza levasse o corpo do menino para longe. A rede foi estendida, presa a estacas, no domingo (31) e durante a retirada, na tarde da terça-feira seguinte, apresentava dois buracos, como se algo a tivesse atravessado, e segundo os moradores que a retiraram, não estavam lá quando foi colocada. Também não havia nenhum peixe preso a ela.

Os relatos

Segundo contaram o tio e o padrasto, os adolescentes brincavam na beira do rio quando o mais velho resolveu caminhar sobre algumas pedras existentes no local. Ele, que não sabe nadar, acabou resvalando e caindo em uma área funda, com profundidade entre 03 e 04 metros. Para tentar salvá-lo, mesmo sem saber nadar direito, o irmão mais novo pulou na água. Todos passaram a gritar e o tio dos garotos, que mora a cerca de 100 metros do local, correu para o rio e resgatou o mais velho, que já estava semi-inconsciente, e avisou para o mais novo continuar a bater os braços que ele já iria buscá-lo. Neste instante, um amigo do tio chegou ao rio e entrou para buscar Guilherme, as meninas então teriam visto na outra margem, a cobra entrar na água e ir em direção ao amigo do tio. Elas gritaram, o homem voltou para a margem e a cobra então teria virado em direção a Guilherme. As garotas jogaram pedras e paus para tentar assustar o animal, que mergulhou. Logo em seguida todos teriam visto parte da cobra enrolar no menino e puxá-lo para o fundo. Todos contaram a mesma história, com exceção da avó do garoto, que me disse não acreditar que a cobra teria pego Guilherme. “Acho que ele se afogou apenas, mas a cobra existe, muita gente já viu”. Passei então a conversar com outros moradores e realmente, muitos confirmaram já ter visto o animal, inclusive acreditam na possibilidade de haver mais de um, devido a diferença dos tamanhos em alguns avistamentos.

Animais desaparecem

Ainda de acordo com os relatos ouvidos, por ano, desaparecem cerca de três a quatro cachorros que vivem soltos pelos terrenos que circundam o rio, além disso, também já teria ocorrido o sumiço de alguns porcos.

Não existe

Também conversei com moradores que afirmam não existir tal cobra no local. Pessoas que acampam a beira do rio, possuem casas nas proximidades, pescam no local e dizem nunca ter visto o animal.  “Sou pescador velho daqui e conheço esse Teixeira aí, da cabeceira até o fim da picada dele, onde fica grande daí. Pesco a mais de 35 anos nesses lugares aí, às vezes fico até 30 dias acampado e nunca vi nada, só capivaras”, relatou um dos entrevistados.

Como a cobra chegou

Segundo os relatos, anos atrás um morador teria trazido um casal de sucuris para criá-las no açude da propriedade. Uma teria morrido e a outra desaparecido durante uma noite de muita chuva, que acabou estourando o açude. Também se ouve relatos de um segundo morador que teria trazido do Mato Grosso dois casais de sucuris, mas devido a dificuldade para criá-las, acabou soltando-as no rio. Nenhuma das duas histórias pôde ser comprovada pela reportagem.

Patram

Na terça-feira (02) equipes da Patram de Erechim e Nonoai, com o apoio de homens do Corpo de Bombeiros de Getúlio Vargas passaram a caçar a cobra, mas até às 16h da tarde de quinta-feira (04), horário de fechamento desta edição, nada havia sido encontrado. Em nota divulgada no facebook na quarta-feira (03), a Patram informou que “realizou várias buscas no Rio Teixeira, aonde, conforme informações, uma Cobra havia provocado a morte de um Menino de 12 anos. Durante as buscas não foi localizado o suposto animal, as buscas irão continuar durante os próximos dias. Estas espécies de Cobras não são comuns no Estado do Rio Grande do Sul, mas já foram localizadas em outros municípios do RS, diante disso a Patram nunca descartou a possibilidade da existência do réptil. No local ocorreu a morte de uma pessoa, aonde conforme informações de familiares, teria sido provocada por uma Cobra, diante desse fato necessitamos nos colocar na situação de familiares e prestar todo o apoio possível para verificar a existência ou não do Réptil. Todas as pessoas que presenciaram o fato serão ouvidas para ajudar no esclarecimento do fato. A Patram permanecerá no local e todas informações podem ser repassadas por esta Rede Social ou pelo fone 3519-9723”.

Desinformação

No final da tarde de segunda-feira (01) notícia divulgada por um órgão de imprensa de outro município informou que a necropsia realizada no menino teria comprovado o ataque de uma cobra devido a ele ter vários ossos quebrados por uma pressão mecânica muito forte. Devido a credibilidade de tal órgão, a informação foi compartilhada por outros jornais, inclusive por este repórter, mas acabou sendo desmentida no dia seguinte, quando o IGP divulgou nota afirmando que o menino havia sido vítima de afogamento e não apresentava lesões, mesmo assim, autoridades estaduais e federais vinculadas a órgãos de meio ambiente se reuniram na mesma data para discutir medidas e precauções a serem adotadas após a morte de Guilherme.

 

Ibama

Segundo o superintendente do Ibama em exercício, Paulo Wagner, em entrevista para o jornal Zero Hora, “É um rio (Teixeira) que tem entre sete e oito metros de largura e está com baixa vazão. Não suporta uma população de sucuri ou de píton, que é uma cobra exótica. Para arrastar um menino para dentro de um rio, precisa ser um animal grande, com quatro ou cinco metros de comprimento. Um ofídio desse porte seria encontrado se estivesse lá”. O superintendente disse ainda que “Não estamos colocando ninguém em suspeição, mas não se espera encontrar esse tipo de animal naquela região. Por outro lado, não é impossível que alguém tenha levado. Por isso, não descartamos. Aqui no Rio Grande do Sul, já registramos informações sobre a presença de sucuri no Rio Uruguai. Mas essa região de Ipiranga do Sul não é cruzada pelo Rio Uruguai”. Na entrevista para a Zero Hora, o superintendente do Ibama explicou ainda que “as serpentes constritoras – como são chamadas as espécies que se enlaçam nas presas para exercer pressão – acabam ocasionando a morte do alvo por asfixia, e não por lesões ósseas. O objetivo de neutralizar a vítima é mais rapidamente alcançado quando o réptil consegue também puxar o corpo para dentro da água, onde o afogamento se soma à dificuldade de respirar imposta pela constrição”.

 

Por Alan Dias

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