Conheça o sistema contra cheias de Nova Orleans e as alternativas propostas em Porto Alegre após 1941
Cidade americana sofreu com inundações após passagem do furacão Katrina, em 2005. Estrutura construída nos EUA tem semelhanças com projetos pensados para Porto Alegre
Milhões de habitantes sofrendo com uma catástrofe climática extrema. Inundações em larga escala. Bairros inteiros em baixo da água. Pessoas desaparecidas e óbitos. O ano era 2005 e a região Sul do estado americano da Louisiana sofreria com aquela que é, até hoje, uma das maiores calamidades naturais vivenciadas nos Estados Unidos.
No lugar de uma enxurrada que se estendeu por dias, um furacão e o avanço das águas do golfo do México causaram a destruição em diversas cidades, principalmente na metrópole de Nova Orleans. Assim como em Porto Alegre na grande cheia de 1941, um plano precisava ser colocado em prática para evitar novas catástrofes na região.
Depois de uma década em construção e mais de 14 bilhões de dólares investidos – cerca de R$ 70 bilhões – o complexo sistema de proteção foi finalizado em 2015 para proteger a cidade. Em sua base, estão mais de 500 quilômetros de diques, mais de 70 casas de bombas, comportas, canais extravasores e muros com até 8 metros de altura construídos tanto nas áreas mais baixas de Nova Orleans até em meio às águas do rio Mississípi e dos lagos que circundam a capital.
A cidade americana, que fica localizada abaixo do nível do mar, já contava com um sistema quase centenário de diques e casas de bombas em 2005, durante a passagem do Katrina, mas falhas no funcionamento permitiram que cerca de 80% da cidade ficasse em baixo da água, com mais de 1,5 mil mortos.
O moderno sistema foi colocado à prova em agosto de 2021, quando um outro furacão, o Ida, atingiu a região. Desta vez, mesmo com o aumento do nível da água nos lagos que circundam a cidade, os diques reforçados, os muros mais altos e todo o complexo sistema de casas de bombas e extravasores impediram que Nova Orleans ficasse novamente submersa.
O furacão Ida foi o segundo mais intenso a atingir a Louisiana, ficando atrás apenas do Katrina. O número de mortos em 2021 foi de cerca de 30 pessoas, com algumas delas vindo a óbito por consequências do episódio, como a falta de energia e o envenenamento por monóxido de carbono, utilizado para acionar geradores.
Porto Alegre teve outras propostas de proteção contra cheias
Além do atual sistema de prevenção contra as cheias em Porto Alegre, a capital discutiu outras alternativas após a cheia história de 1941. Do aumento da vazão na foz com a Lagoa dos Patos, passando por um muro que atravessaria as ilhas e até mesmo um canal que ligaria o rio Gravataí até o oceano Atlântico, muitas propostas foram discutidas na época em um congresso organizado pela Sociedade de Engenharia do RS, conforme o jornalista e escritor Rafael Guimaraens, autor do livro “A Enchente de 41”. Conheça as propostas:
Canal até o oceano:
Uma das primeiras propostas apresentadas no congresso da Sociedade de Engenharia foi a inversão do fluxo do rio Gravataí, além da construção de um canal de 80km até onde hoje é Balneário Pinhal. Desta forma, em vez do rio desaguar no Guaíba, ele serviria como um braço para escoar água até o oceano. O canal também atingiria o rio dos Sinos, fazendo com que a água do seu leito também escoasse por ali. Segundo o escritor, a proposta foi refutada por ser muito cara e, ao fazer a ligação do Guaíba com o mar, causaria o esvaziamento dos portos de Pelotas e Rio Grande, na região Sul, causando grave desequilíbrio econômico ao RS.
Barragens e vazão na foz:
Outras alternativas discutidas no congresso abordavam a possibilidade da construção de uma série de barragens nos rios que formam a bacia hidrográfica do Guaíba, ajudando a controlar os seus níveis. Ao todo, deságuam em Porto Alegre os rios Jacuí, Caí, Sinos e Gravataí, mas outros afluentes como o Taquari, das Antas, Pardo e Vacaraí também possuem influência na bacia. Além disso, foi aventada a possibilidade de aumentar a vazão na foz do Guaíba junto à lagoa dos Patos, criando canais na região de Itapuã, em Viamão. As propostas necessitavam um estudo maior da bacia para definir a sua viabilidade.
Fortaleza nas ilhas:
Uma das alternativas foi sugerida pelo então reitor da Universidade de Porto Alegre (que viria a ser nomeada de Universidade Federal do Rio Grande do Sul anos depois), o engenheiro Ary de Abreu Lima. Ele propôs a construção de um muro que atravessaria o Guaíba em direção às ilhas, partindo da Usina do Gasômetro, passando pelo meio das águas, atravessando a ilha do Cônsul, a ilha Grande do Marinheiros e a ilha do Pavão, retornando nas proximidades da rua Voluntários da Pátria, no bairro Navegantes. Além disso, um canal cortaria a ilha das Flores e a ilha Grande dos Marinheiros, ajudando a escoar a água dos rios do Sinos e Gravataí para o delta do Jacuí. O muro sobre o Guaíba ainda teria duas comportas para acesso de navios. Segundo Guimaraens, a proposta foi considerada muito onerosa e traria impactos ambientais. O desenho apresentado à época se assemelha muito ao sistema complexo de Nova Orleans.
Diques, muro e bombas:
A proposta que foi aplicada na prática surgiu em um plano apresentado pelo Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS). Nela, estava detalhada toda a proteção que seria feita por diques, sendo dois partindo do Centro Histórico em direção às zonas Norte e Sul, além de uma “muralha” que seria erguida em concreto armado para servir de “cortina de vedação” na região do Cais. Até ser construída de fato, o projeto sofreu alterações, como a construção de aterros. Entretanto, desde o início, já estavam previstas as construções de casas de bombas e de outros diques dentro da capital, como o do Sarandi, do Cristal e da Praia de Belas, além das avenidas e estradas elevadas.
O início das obras deste sistema de proteção iniciou na década de 1950, com a construção do dique da freeway e da avenida Castelo Branco. Na sequência, foram feitos os aterros na orla do Guaíba, nas proximidades do atual Centro Administrativo Fernando Ferrari e do bairro Menino Deus, junto à construção do dique da avenida Edivaldo Pereira Paiva. Entretanto, as obras do Muro da Mauá só começaram depois que Porto Alegre sofreu com mais uma enchente no final da década de 1960.
Por Correio do Povo