Conheça o casal que leva a vida a bordo de um caminhão

Nesta semana, muitas foram as comemorações e felicitações pela passagem do Dia do Colono e Motorista. Os colonos são os responsáveis pelos principais alimentos que consumimos todos os dias e os caminhoneiros levam na carroceria muito mais do que mercadorias, mas a riqueza do trabalho de tanta gente. Pensando no potencial destes trabalhadores, o Jornal Boa Vista, relata nesta edição a belíssima história de um casal erechinense que leva a vida a bordo de um caminhão.

 

Na estrada há 35 anos

Todo ano o encontro com a família precisava ser adiado, Natal, aniversário das filhas, esposa e tantas outras datas marcantes. Na estrada há 35 anos, o caminhoneiro, Valdecir José Andreolla, acostumou com a distância, por mais que o coração aperta ao olhar para trás e ver o que perdeu longe das filhas, as festinhas e atividades da escola, brincadeiras na rua e muitas fases do crescimento.

 

 

 

Dividindo o volante

Mas a solidão hoje dói menos, pois, há cerca de nove anos, ele divide o volante com a mulher, Ivanete Poletto Andreolla, e é ela, quem conta detalhes de como é a vida a bordo do caminhão. Com as filhas já maiores de idade e formadas, ela decidiu trabalhar com o marido e realizar um sonho antigo. “Como meu marido está na estrada há muitos anos, decidi acompanhá-lo, pois a rotina de um caminhoneiro é bem diferente de qualquer outro profissional, não tem sábado, domingo, feriado, trabalhamos direto. Não tem horário para dormir, fazer as refeições, mas sim para chegar, descarregar e apurar para carregar novamente. Às vezes você anda a noite toda para tentar descarregar de manhã, chega ao destino e tem fila ou, anda o dia todo para tentar carregar e chega ao local só no outro dia. Por vezes chegamos na sexta-feira e só é possível carregar o caminhão na segunda. Tem que ter muita paciência e gostar da profissão”, disse Ivanete.

Mercado defasado

Sem contar que se o caminhoneiro não tiver um frete certo, uma carga garantida, fica complicado, pois o mercado está defasado há anos. Em contrapartida, os custos com combustível, pneus, manutenção e pedágio aumentam desenfreadamente. “O óleo diesel estava aumentando toda a semana, mas a greve contribuiu para provar que o caminhoneiro pode parar o Brasil, que ele é importante. Muitas pessoas questionam quais foram os resultados da paralisação, mesmo não tão aparentes, a redução dos 46 centavos no diesel já ajudou. Parece pouco, mas é bastante para quem abastece quase todos os dias. Ainda, foi isenta a cobrança de tarifa de pedágio para eixo elevado. O que está para vigorar é a tabela de frete, estamos aguardando, pois, os valores estão desatualizados, mas acredito que essa questão tende a melhorar”, relatou.

 

 

“Tem que ter Deus e São Cristóvão como proteção todos os dias”

A profissão de caminhoneiro envolve uma paixão que contagia, são horas a fio na estrada, muitas vezes contando apenas com o bom e velho rádio como companhia. Quem precisa tirar desta profissão sua subsistência, também enfrenta perigos constantes. “Tem que ter Deus e São Cristóvão como proteção todos os dias. São inúmeros os acidentes e assaltos. Quebrar o veículo e ficar em local onde não tem acesso a telefone, ocioso a tudo, amedronta”, explicou a caminhoneira. Os problemas nas estradas ainda dificultam a vida do profissional que tem em suas mãos e rodas a riqueza do Brasil para ser conduzida. “As estradas onde não existem pedágios são péssimas, intransitáveis, do interior de São Paulo a Santiago, de três caminhos que teríamos por fazer, não há possibilidade. Temos que realizar uma volta de mais de 100 km por Santa Maria para fugir dos buracos e crateras. Desloca pneu, quebra, é bem complicado”, contou.

 

“Me emocionei, me senti gente”

Dentre tantos ‘pré-conceitos’ à categoria, Ivanete diz que muitas coisas mudaram, principalmente com relação à mulher. “Teve épocas que ninguém queria falar em caminhoneiro, casar com um então, Deus me livre. Hoje, o cenário é diferente e eu mesma, consigo compreender a força destes trabalhadores, o quanto estamos unidos e a admiração que a mulher conquistou. Com a greve, ficamos 10 dias parados e senti na pele que o povo ficou do nosso lado, me emocionei, me senti gente”, explicou.

É claro, muitos ajustes ainda são necessários. A condutora conta que já se deparou com situações como falta de banheiro com chuveiro para mulheres e muitos deles ainda sem condições de higiene. “Por vezes não é possível escolher os pontos de parada e então, nos deparamos com banheiros imundos. Há uma carência muito grande e falta de atenção às mulheres neste sentido”, afirmou.

 

Entre os desafios enfrentados ao dormir e se alimentar nas estradas, saudade das filhas, idas e vindas dos pátios de postos de combustíveis, amizades vão sendo costuradas e o volante do caminhão vai sendo dividido pelo casal.

Por Carla Emanuele 

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