Ações trabalhistas na Justiça ultrapassam 2 milhões em 2024, maior aumento desde a reforma
Foram 2.117.545 novos processos no ano passado, uma alta de 14,1% em comparação a 2023.
O número de novas ações na Justiça do Trabalho superou 2 milhões em 2024 no Brasil. É a primeira vez que a marca é atingida desde a aprovação da reforma trabalhista, em 2017, e também é um recorde de judicialização na área trabalhista no período pós-reforma.
Foram 2.117.545 novos processos no ano passado, uma alta de 14,1% em comparação a 2023. A série histórica mostra uma queda nas ações após a aprovação da reforma trabalhista, que trouxe medidas validando acordos diretos entre empresas e empregados, mas os processos voltaram a crescer.
Conforme Rogério Neiva, juiz do Trabalho, ex-auxiliar da vice-presidência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e especialista em métodos de conciliação, a principal causa para o aumento das ações é uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de outubro de 2021, que facilitou o acesso gratuito à Justiça.
A chamada justiça gratuita é dada para pessoas que não têm condições de pagar pelas custas do processo e precisam de auxílio da Justiça. A reforma trabalhista impôs novas regras. Se a pessoa perdia a ação, ela passou a ter de pagar os honorários periciais e os advogados da outra parte, mesmo que fosse beneficiária da justiça gratuita. O Supremo invalidou essas regras em 2021.
“É possível considerar que a decisão do STF é um fator que influencie e explique esse movimento. Essa é uma questão relevante porque o custo é zero”, diz Neiva. “Hoje, podemos afirmar que a situação voltou ao cenário anterior à reforma trabalhista de almoço grátis.”
Outro fator que estimula mais as pessoas a entrar com reclamações trabalhistas, de acordo com o magistrado, é a condição criada para comprovar a renda. “Na justiça estadual (em processos não trabalhistas), se você entra com a ação e fala que é pobre e não tem condição de pagar as custas do processo, você tem de provar que é pobre. Na Justiça do Trabalho, não; é a outra parte que tem de provar que você não é.”
A assessoria do Tribunal Superior do Trabalho (TST) afirmou que o aumento dos processos se deve “à alta rotatividade nas contratações e demissões agravadas pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas.” Ou seja, mais pessoas pedindo demissão, sendo demitidas e trocando de empresa, além do não pagamento dos direitos por parte das empresas, o que exige intervenção da Justiça.
Para o especialista, no entanto, o cenário de contratações e demissões não explica o aumento da judicialização. Os desligamentos registrados na base do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) demonstram que houve aumento de 9,3% nas demissões em 2024 em comparação com o ano anterior, enquanto o aumento das ações trabalhistas corresponde a 14,1% no mesmo período.
A Justiça do Trabalho ainda não divulgou o relatório final dos processos em 2024. No ano anterior, quando também houve aumento das ações, os tribunais identificaram que os assuntos mais recorrentes nos processos foram multa de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), adicional de insalubridade, verbas rescisórias, multa adicional por demissão e horas extras.
A reforma trabalhista tem um artigo inteiro determinando quais temas podem ser ]s diretamente por acordo coletivo e que se sobrepõem ao que está escrito na lei, incluindo jornada de trabalho, intervalo para almoço, banco de horas e trabalho remoto. É o chamado “negociado sobre o legislado”, um dos principais marcos da lei aprovada em 2017, no governo de Michel Temer.
No ano passado, além das ações, também aumentou o valor pago pelas empresas nas sentenças: R$ 48,7 bilhões, um crescimento de 18% em relação ao ano anterior, quando os pagamentos somaram R$ 41,3 bilhões. Houve crescimento tanto nos valores pagos após decisão da Justiça quanto nos acordos feitos entre as partes.
“Parte disso pode ser explicado por um movimento muito forte dentro da Justiça para execução de decisões, ferramentas de investigação de apropriação patrimonial, identificação de bens ocultados e de laranjas”, diz o juiz. “A Justiça do Trabalho está botando para quebrar em cima da turma que não paga condenação.”
O TST afirmou que tem desenvolvido e dado ênfase à cultura de conciliação e resolução de precedentes para diminuir o volume de processos. “No âmbito da conciliação, proporcionou, através dos Centros Judiciais de Solução de Conflitos (Cejuscs), somente em 2023, a realização de acordos no valor total de mais de R$ 7 bilhões, com recolhimentos previdenciários acima de R$ 1 bilhão”, disse o tribunal.
A Corte trabalhista declarou que os Incidentes de Recursos de Revista Repetitivos (IRR) e os Incidentes de Assunção de Competência (IAC), que organizam o entendimento da Justiça do Trabalho para vários processos, “trarão decisões qualificadas, de cunho obrigatório, a garantir a estabilidade e a segurança jurídica.”
Com informações O Estado de São Paulo