Embora o desemprego tenha atingido 14,7% da força de trabalho no Brasil, o setor industrial segue enfrentando dificuldades para encontrar mão de obra qualificada. De acordo com um estudo publicado pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI) em 2020, cinco em cada dez indústrias não conseguem encontrar profissionais qualificados.
E um dos principais fatores para que isso esteja acontecendo é a má qualidade da educação básica no país, segundo Thiago Korb, Gerente de Educação Básica e Profissional da SESI-SENAI/SC.
“Isso também acontece na formação profissional, no entanto, é essencial preparar os jovens desde a base para uma condição importante de qualificação. A falta de mão de obra é algo crônico no Brasil, não é algo advindo da pandemia, mas é claro, ela intensificou essa escassez”, afirma.
Já nos EUA, embora o cenário seja diferente quando comparado à economia e educação do Brasil, a dificuldade de preencher a lacuna de talentos no setor industrial também tem sido a mesma. De acordo com uma pesquisa publicada pelo The Workforce Institute, mesmo com muitos fabricantes emergindo em bases sólidas durante esse período, com mais da metade (54%) alcançando um crescimento ano a ano, a escassez de profissionais aumentou mais ainda.
Para se ter uma ideia, antes da pandemia o percentual era de 38% e depois da pandemia saltou para mais da metade (54%). No Brasil, além da falta de escolaridade ser apontada como um dos principais fatores para encontrar mão de obra qualificada, segundo a CNI, a recessão em 2015 e 2016, e os anos seguintes de lenta retomada da economia, também colaboram para o atual cenário.
Como promover a valorização da carreira profissional na indústria?
Para Korb, a reforma do novo Ensino Médio no país, assim como o investimento em qualificação e requalificação de trabalhadores, são ações de curto e longo prazo que podem trazer soluções para as indústrias.
“Em Santa Catarina, por exemplo, 45% dos trabalhadores que estão na indústria não têm escolaridade básica completa. Nós sabemos que isso tem impacto direto na produtividade da indústria. Afinal, quanto mais a indústria é produtiva, mais competitiva ela é, e quanto mais competitiva, mais ela fatura e faz girar a economia”.
De acordo com a CNI, no Brasil, apenas 9,7% das matrículas do ensino médio são em cursos de educação profissional. “Países como Alemanha, Dinamarca, Portugal e França, têm um percentual de articulação de 40%, ou seja, quatro vezes mais. E se formos olhar para o case máximo, seria Áustria e Finlândia, que chegam a 70%”, compara Korb.
Para ele, ainda existe um estigma muito forte no país sobre a educação profissional, de que ela é uma formação para operários. “Hoje a formação técnica habilita o profissional não mais para as atividades operacionais, mas sim para uma nova indústria – para a indústria 4.0”, afirma.
Outro dado importante citado no estudo da CNI ressaltado por Korb é onde está a falta de mão de obra. A grande maioria (96%) das empresas tem dificuldade de encontrar operadores. “Engana-se quem pensa que a falta de mão de obra é só daquela muito qualificada, aquela que é realmente de nível técnico ou de ensino superior. Encontrar operadores não tem sido uma tarefa muito fácil porque essa função requer um nível de especialização técnica também”, destaca.
Ainda na área de produção, 90% das empresas relatam que têm dificuldade para preencher vagas de nível técnico. E na contramão disso, 82% das empresas dizem que têm dificuldade de investir na formação dos seus trabalhadores.
“Esta é uma equação complexa de ser gerenciada porque há falta de qualificação, mas também há falta de recursos para investir na formação desses profissionais”, avalia. Ainda de acordo com o estudo, a falta de profissional qualificado prejudica 97% das empresas que enfrentam esse obstáculo. Isso reflete diretamente na produtividade e na qualidade do produto.
Outro dado apontado em uma pesquisa mais recente, mostra que 82% das grandes empresas pretendem investir neste ano, 35% desses investimentos em melhorias do processo produtivo e 33% para o aumento da capacidade de produção, com a aquisição de novas máquinas e tecnologias.
Como a escassez de mão de obra qualificada afeta a cadeia de suprimentos?
“A economia passou por uma recessão no ano de 2020, e isso está impactando os preços em 2021, um dos principais setores atingidos é o da alimentação, que nós consumimos bastante. Tem variação de preço de até 40% do que nós pagávamos , e isso com certeza impacta no planejamento das empresas”, explica Korb.
Segundo a CNI, 70% das empresas tiveram dificuldade na produção de algum tipo de insumo doméstico em 2021, e 60% desses insumos eram de matérias-primas importadas. “Nós sentimos o impacto dessa importação, mas também sabemos que as barreiras sanitárias e alfandegárias em função dos protocolos de segurança aumentaram. Além disso, 65% das empresas falaram que encontraram dificuldade mesmo pagando mais caro para obter esses materiais”.
Quando falamos de cadeia de suprimentos, segundo Korb, é necessário pensar na disposição da matéria-prima, na logística de cadeia, como esse suprimento chega e como ele vai ser entregue depois de ser transformado. Portanto, a condição desses modais, tanto de acesso quanto de agilidade, precisam ser observados.
Quando se faz uma conexão com a Indústria 4.0, Korb afirma que as cadeias de suprimentos terão que ser mais enxutas, mais ágeis, mais resilientes e mais ambientalmente sustentáveis. “Este cenário tem sido discutido no que eles chamam de logística 4.0, onde é combinado todas essas inovações com aplicativos, com outras ferramentas que trazem dados em tempo real buscando aumentar essa eficácia, a eficiência da regulação e dessas relações entre essas questões”.
Investir em competências da indústria 4.0 é a chave para o caminho do sucesso
Para o especialista, o Brasil tem muita condição de se desenvolver economicamente. No entanto, é preciso investir em competências da indústria 4.0, tanto a empresa quanto o trabalhador. Para ele, existem ações de curto e longo prazo. As ações de curto prazo são a qualificação e requalificação da força do trabalho.
“Essa é imediata, ela precisa acontecer agora. Precisamos de uma indústria moderna, com automação, digitalização, com realidade aumentada, com IoT, que são os focos da indústria 4.0 e, ao mesmo tempo, nós também temos que pensar na qualificação dos jovens e dos trabalhadores que não tiveram acesso à educação básica, ou à educação profissional de primeiro nível”, disse Korb. “
Já a longo prazo, são mudanças mais estruturais e sociais, que tem a ver com essa questão do ensino médio. O SESI e o SENAI já estão entregando as primeiras turmas esse ano, nesse novo modelo, mas no Brasil isso entra em vigor no ano que vem. Então, tem muita chance da gente transformar essa sociedade com ações mais estruturadas, mais regulamentadas em relação à própria formação básica”, acrescentou.
Dados da CNI apontam para um futuro cada vez mais alinhado à indústria 4.0, sendo que 78% das empresas já estão investindo em tecnologias digitais. “O trabalhador que entender esse movimento e começar a se preparar para essas novas condições, com certeza, vai ter uma possibilidade de empregabilidade muito maior. E a empresa que investir, vai ter um diferencial competitivo também”.
Sobre a questão dos skills mais procurados no mercado, Korb aponta uma situação que tem sido cada vez mais comum. “As pessoas são contratadas pelas suas competências técnicas, mas são desligadas por competências socioemocionais. E isso impacta de uma forma muito significativa.
Para ele, a resolução de problemas complexos e o pensamento criativo estão entre os softs skills mais demandados. “Estar preparado para enfrentar o ambiente virtual e processos virtuais também são questões que precisam ser trabalhadas. Se é um cenário novo, onde a digitalização faz parte da vida das pessoas, isso requer novos formatos de comportamento também no ambiente virtual”, finaliza.
De maneira geral, a Indústria 4.0 necessita de investimento em qualificação de mão de obra de forma constante. Isso acarretará no preenchimento das vagas que o próprio mercado não consegue preencher, e também, aumentará a capacidade produtiva de toda cadeia.
Fonte: Indústria 4.0