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Guerra na Ucrânia: esclarecimentos sobre o risco de um conflito nuclear, negociação de paz e refugiados

Em entrevista ao Estúdio Boa Vista, o jornalista e professor Vitelio Brustolin afirma que, “a possibilidade de uma 3ª Guerra Mundial é ainda remota, pois nesse momento não existe por parte de ninguém o interesse em uma guerra atômica”.

Com imensa satisfação, a Rádio Cultura entrevistou nesta manhã de terça-feira (22), o jornalista, pesquisador, escritor, advogado e professor Vitelio Brustolin que é natural de Erechim. Hoje leciona na Universidade Federal Fluminense do Rio de Janeiro e é comentarista de guerra para grandes redes mundiais de televisão e também outros órgãos da imprensa.

Nesta entrevista, a Rádio Cultura e Jornal Boa Vista traz para você as principais informações e esclarecimentos sobre este conflito. Confira:

Rádio Cultura e Jornal Boa Vista: Estamos prestes a completar o primeiro mês de guerra entre Rússia e Ucrânia e nós tivemos uma declaração recente do presidente da Ucrânia, Zelensky, de que a Rússia através dos caminhos que tem tomado está indicando que poderá ter uma 3ª Guerra Mundial, isso de fato pode acontecer?

Vitelio Brustolin – Zelensky quer falar diretamente com o presidente Putin, já Putin afirmou que irá falar com ele somente quando for para assinar o tratado de paz, e o ministro das relações exteriores da Rússia, Serley Lavrov, também já disse isso. Neste momento temos um impasse, pois alguns líderes mundiais acreditam que os países estejam próximos de um acordo, mas a declaração de Zelensky de que terá que ser feito um referendo com a população da Ucrânia para decidir sobre esse acordo não indica isso, porque ele sozinho não tem o poder para alterar a constituição da Ucrânia. O que os russos querem é que seja retirado da constituição a intenção de ingresso na Otan e na União Europeia. Seria necessário fazer uma constituinte para rever a continuação, porém há outros pontos que só a população poderia aprovar, por exemplo, a independência de regiões da Ucrânia, como Donetsk e Luhansk. Existem questões que Zelensky gostaria de levar para a referenda, no entanto, organizar um referendo em meio a uma guerra onde mais de 10 milhões de pessoas estão fora de casa e tem 3,5 milhões de refugiados, que equivale a população inteira do Uruguai. Imaginem: a população inteira como a do Uruguai saindo para outros países da Europa, é muita gente! E seria realmente difícil de entender como seria esse referendo, o que demonstra que não há uma negociação viável de paz nesse momento.

 

Qual é o risco de um conflito nuclear?

Primeiro, a Otan não tem interesse em entrar nessa guerra ativamente, o que isso significa?  A Otan vem fornecendo armamentos para a Ucrânia e esses armamentos são defensivos, ou seja, a Otan fornece armas antitanques. Então, se a Rússia invadir o perímetro de algumas cidades com tanques de guerra, os mesmos serão explodidos pelos Javelins (nome desses armamentos). Estes, atacam os tanques por cima onde a blindagem é mais fina porque os tanques tem blindagem mais espessa nas frentes e nas laterais, justamente para se defender de outros tanques. A Otan também fornece armamentos defensivos terra-ar, que são os Stingers (mísseis que podem ser operados por uma ou duas pessoas) que atacam aviões até 5 quilômetros de altura. Ou seja, esses equipamentos não podem ser usados pela Ucrânia, por exemplo, para promover uma contra ofensiva contra a Rússia em território russo, o que poderia ser usado contra a Rússia seriam aviões que a Polônia ofereceu, os MiG-29, mas os Estados Unidos não concordaram em transferir essas aeronaves porque Putin declarou que se algum aeroporto de outro país fosse usado para operações militares, esses países seriam considerados zona de guerra e isso então, estenderia a guerra para uma dimensão maior. Ninguém tem interesse que haja uma 3ª Guerra Mundial, na verdade, tudo o que o Putin fez até o momento foi mandar mensagem para o Ocidente ao mandar tropas fazerem exercícios na fronteira da Ucrânia, o que ele está dizendo é: Ucrânia se afaste da Otan, Otan se afaste da Ucrânia.  A possibilidade de uma 3ª Guerra Mundial neste momento ainda é remota. Ela existe? Existe! Por exemplo, se um míssil da Rússia cair sobre a Polônia que é um país membro da Otan podemos ter uma guerra porque o Artigo V do tratado da Otan prevê que o ataque a um país membro da Otan é um ataque a todos os países da Otan. Já teve drones russos que caíram na Otan, mas esses drones caíram por falta de combustível. Nesse momento, não existe por parte de ninguém o interesse em uma guerra atômica, muito menos os detentores dos arsenais, porque se eles atacarem irão ser atacados também e acabariam destruindo seus próprios países.

 

Em relação a negociação de paz, quais são as possíveis alternativas para o fim do conflito?

As alternativas são as seguintes: Putin quer a soberania da Ucrânia, isso é um fato. Ele tem as seguintes demandas na mesa: rendição militar da Ucrânia. Por segundo: que a Ucrânia mude a constituição e retire a intenção de ingressar na Otan e na União Europeia, um ponto difícil porque em 2013 o Viktor Yanukovych que era o presidente da Ucrânia na época e era um presidente pró-Rússia havia negociado um acordo de cooperação comercial com a União Europeia, e na última hora ele voltou atrás e resolveu que não faria mais esse acordo e isso levou uma multidão para as ruas. Os ucranianos ficaram três meses protestando entre o final de 2013 e início de 2014. Esse protesto culminou no impeachment de Yanukovych enquanto ele fugia para a Rússia e na sequência, o presidente Putin anexou a Crimeia e os ucranianos tiveram o senso nacionalista aumentado. Em 2016, a Ucrânia assina esse acordo comercial com a União Europeia em 1º de janeiro e segue em vigor até hoje. Para a Ucrânia, entrar na União Europeia já é um passo em termos defensivos, não é necessário que a Ucrânia ingresse na Otan necessariamente porque a Rússia diz que se sente ameaçada, só que o ingresso na União europeia é lento e passa por uma série de exigências. E por último: o reconhecimento que a Crimeia é uma região russa que foi anexada e que a Ucrânia não reconhece e briga com a corte internacional da justiça até hoje, um processo que começou em 2014. Essas demandas não são tão simples e precisam passar por uma aprovação da população.

 

E qual é a situação dos refugiados?

Ainda não é a maior crise migratória porque a maior crise é da Síria que tem mais de 6 milhões de refugiados, mas essa crise da Ucrânia avança muito rapidamente e em menos de um mês de guerra estamos com 3,5 milhões. É a crise que mais rapidamente avança desde a 2ª Guerra Mundial. A maior parte dessas pessoas estão indo para a Polônia, que tem mais de 2 milhões de refugiados e tem 37 milhões de habitantes e a Ucrânia tem 44 milhões. Por enquanto, os poloneses recebem muito bem os ucranianos, mas daqui a pouco talvez não seja mais assim, pois é uma multidão de gente no território e essas pessoas precisam de uma infraestrutura, irão precisar de um trabalho, pois o país delas está destruído. Se elas quisessem voltar hoje para a Ucrânia, não é a mesma Ucrânia onde elas moravam antes. Elas perderam os empregos, as casas, muitas delas não existem mais, os prédios foram bombardeados, as cidades bombardeadas, a economia do país está arrasada. É provável que muitas dessas pessoas refugiadas fiquem onde elas estão agora, porque elas têm que sobreviver nesse meio tempo enquanto a guerra perdura e depois sobreviver para a reconstrução da Ucrânia. Existem também os refugiados que vão para a Rússia e a Rússia tem uma intenção muito clara em relação a isso, ela quer que quem é contra a Rússia se afaste da Ucrânia e quem é pró-Rússia depois volte para reconstruir a Ucrânia, o que seria muito complicado porque vai haver atrito de qualquer forma.

Por Aline Koproski.

 

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