“Eu não sou gaúcho de setembro, sou gaúcho de nascimento”, afirma professor impedido de dar aulas pilchado

Edison Luiz Soares Silveira (foto acima), de 57 anos, professor de cursos profissionalizantes em Santa Maria, pediu demissão do local em que trabalhava depois de, segundo ele, receber orientação de sua coordenadora para deixar de dar aulas pilchado. Silveira afirma que trabalhava na instituição desde junho de 2012 e que só em 31 de janeiro deste ano foi notificado sobre suas vestimentas.

– Foi quando a coordenadora me avisou que, daquele dia em diante, eu não deveria ir mais trabalhar pilchado. Ela afirmou que os meus outros colegas não tinham o costume de ir trabalhar pilchado e que eu estaria fora do padrão definido pela empresa (uniforme) – comenta Silveira.

Nascido em Uruguaiana, na Fronteira-Oeste, o professor teve uma infância no campo e sempre cultivou a cultura gaúcha. Ao Bei, ele disse que, mesmo pilchado (lenço, bombacha e botas), nunca deixou de usar o uniforme da empresa no trabalho.

– Eu nunca deixei de usar o uniforme que a empresa fornece: uma camisa, e sempre de crachá. Nunca nos deram calça jeans e um sapato social, por exemplo – pontua Silveira. O professor ainda lembra que, em 10 anos trabalhando no local, só esqueceu por duas vezes um item do uniforme, o crachá. Dando aulas sempre de bombacha, o ex-funcionário conta que veio transferido de sua cidade natal para a filial da empresa de Santa Maria, logo no início da pandemia.

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– Eu sou do campo. Eu nasci no campo. Trabelhei na “lida” e sempre usei bombacha desde pequeno. Ao invés de distanciar, meus alunos e colegas, muitos vindos de cidades que também têm a cultura (gaúcha) forte, sempre me procuravam. Creio que se sentiam acolhidos na “cidade grande”. – pondera o professor que deu aulas no local até 7 de março deste ano, quando, segundo ele, não aguentou mais a situação e pediu a demissão. Já no dia 30 de março, ele registrou um boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia de Pronto-Atendimento do fato:

– Eu falei com a minha família e percebi que não precisava estar me submetendo àquilo tudo. Estava ferindo meus princípios, por isso falei com a minha coordenadora e disse que, se os termos fossem aqueles (de não poder usar mais usar, pelo menos, as bombachas), eu não gostaria mais de continuar como funcionário deles. Eles haviam comentado que eu poderia usar as bombachas só em setembro. Eu não sou gaúcho de setembro, sou gaúcho de nascimento – reitera. Por ter ficado abalado com a recomendação de ter que parar de usar as suas bombachas, Silveira alega que procurou ajuda psicológica e fez terapia até o início de abril.

– De fevereiro até quando pedi demissão, tive que usar jeans e sapato social durante o trabalho. Isso me ofendeu bastante. Eu nasci gaúcho, irei morrer gaúcho. Decidi que não iria fazer mais parte de lá. Logo, logo, irei conseguir outro emprego que iguale o salário que recebia ali. Faz falta? Sim senhor, faz falta, mas eu continuo de cabeça erguida. Não irei deixar de usar minhas bombachas porque o outro acha feio, porque não serve para a empresa. Se não serve, tudo bem, mas depois de 10 anos, eles mudaram de uma hora para a outra. Se é regra, tudo bem. Não estou me queixando da empresa, mesmo com tudo isso que aconteceu comigo, ela é uma excelente instituição do ramo – desabafa o professor que diz que recebia cerca de R$ 4 mil de salário, mais benefícios.

Coordenador da 13ª Região Tradicionalista com sede em Santa Maria, Júnior Pozzobon, lembra que essa não é a primeira vez que a cidade protagoniza um caso que envolva as vestimentas tradicionalistas em ambiente de trabalho. Em janeiro de 2018, um taxista foi autuado por trabalhar pilchado.

– É triste ver esse tipo de coisa acontecendo novamente na cidade. Sobre o que aconteceu com o Edison, a 13ª espera justamente o contrário, que professores possam ir de bota, lenço, com bombacha dar aulas, para preservar e resgatar a cultura tradicionalista. Esse é mais um caso de falta de informação, de conhecimento sobre a cultura gaúcha. Esperamos que a empresa, nos próximos dias, se retrate – lamenta Pozzobon.

O QUE DIZ A EMPRESA
Em nota, ao Portal G1, o Sest Senat (Serviço Social do Transporte e Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte) diz que “respeita e valoriza a pluralidade cultural de todas as regiões brasileiras, promovendo projetos e ações que incentivam as tradições e a diversidade, cumprindo assim o seu papel de instituição social responsável também pelo desenvolvimento nacional”.  E também que “preza pela qualidade dos serviços ofertados nas 159 unidades operacionais que mantém em todo o país” e que “mantém diretrizes para a padronização dos atendimentos oferecidos em todo território nacional”. Uma das diretrizes seriam os uniformes, o que permitiria a “identificação dos profissionais que atuam na instituição, garantindo aos clientes um melhor atendimento”.

 

Fonte: Bei

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