— Já reduzi 10% da área na safra passada devido ao custo, pois o adubo subiu mais de 200%. Se houver nova alta, vou reduzir mais. A briga (guerra) é deles, mas prejudica a gente aqui.
Dirigentes de cooperativas de produtores revelaram que os fabricantes e fornecedores de adubo já retiraram as listas de preço do setor comercial, o que pode significar aumento.
Para o engenheiro agrônomo Ricardo Cunha, diretor da Fazenda Lagoa Bonita, produtora de grãos e sementes em Itaberá, no sudoeste paulista, não há nenhum ganho para o agronegócio brasileiro com a guerra.
— Fora a questão humanitária, por enquanto só sentimos efeitos negativos. Aumento nos preços dos fertilizantes, especialmente nitrogênio e potássio, que já estavam muito caros — disse Cunha.
O Brasil depende da Rússia para o fornecimento de grande parcela das matérias-primas para fertilizantes utilizados em lavouras como soja e milho, principais grãos de exportação do País.
Do território russo procedem 20% dos nitrogenados, 28% dos potássicos e 15% dos que têm fósforo em sua composição. A soja, principal commodity brasileira, depende de adubos à base de fósforo e de potássio. O milho depende dos nitrogenados.
Na visão de Cunha, a continuação da guerra só ampliará os efeitos negativos:
— Teremos problemas nas cadeias de suprimento de adubos e na exportação de trigo e milho da Ucrânia e Rússia. Isso pode trazer preços maiores para esses dois cereais. Não sei se (o preço mais alto) irá compensar o aumento de custo dos agricultores.
O agricultor Emílio Kenji Okamura, dirigente da Cooperativa Agrícola de Capão Bonito, que reúne produtores de soja, milho e trigo no sudoeste paulista, também acredita que a guerra vai afetar o fornecimento de fertilizantes.
— Pode haver aumento, senão agora, no segundo semestre — arrisca Okamura.
Da mesma forma, ele crê em elevação nas cotações do milho e trigo:
— A Ucrânia é o quinto país em produção de milho, mas os grandes produtores são Estados Unidos, China, Brasil e Argentina. Esses países podem garantir os estoques. Já com o trigo, o mundo depende muito da Rússia. Se eles segurarem o produto no mercado interno como precaução, não sabemos como vai ficar e onde vai parar o preço.
A alta no preço do trigo pode atingir produtos como pão, pizza e macarrão.
Milho
No caso do milho, a Ucrânia está entre os quatro maiores exportadores, atrás de países como Argentina, Brasil e Estados Unidos. Se, de um lado, o produtor brasileiro pode se beneficiar com a alta de preços devido à menor exportação da produção ucraniana, de outro, os produtores de frangos, ovos e suínos sentirão o impacto do custo do milho na ração.
O pecuarista José Fernandez Lopez Netto, criador de gado de corte em Itapeva, no interior paulista, acredita que, sem levar em conta os aspectos trágicos do conflito, a guerra pode até favorecer o mercado de carne bovina brasileira – o País é o maior exportador do mundo.
— Diferentemente de outros países produtores, o gado brasileiro é criado no pasto. Na maior parte do mundo, o boi é produzido em estábulos e vai sofrer com o alto custo dos grãos, além da energia consumida durante o inverno
O maior comprador da carne nacional é a China, porém, segundo o pecuarista, o Irã e outros mercados estão se abrindo:
— A guerra mexe com o dólar, e sobem todas as commodities. Há impacto no custo de produção do boi, mas o preço da carne também sobe. Para a carne bovina, a tendência é de melhorar.
Para o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Fernando Cadore, a guerra já afetou alguns setores da produção agrícola:
— O primeiro impacto é no preço do petróleo e, consequentemente, dos combustíveis.
Caso a exportação de grãos dos dois países em conflito seja afetada, Cadore analisa que o mercado poderia ser suprido por outros países produtores, como Brasil, Argentina e Estados Unidos. Nesse caso, a produção brasileira seria favorecida pela demanda maior.
Em sua visão, a importância do Brasil no cenário mundial aumenta.
— Com guerra ou sem guerra, o cidadão precisa se alimentar e o Brasil tem produção para garantir a segurança alimentar — finaliza Cadore.
Fonte GZH