E de novo…o problema da estiagem e a falta de água!

De a acordo com a Defesa Civil do Rio Grande do Sul, desde 1979 (quando teve início a série histórica), informa que a cada dois anos ocorre um evento de estiagem relevante no Estado. Em 2004 foram 153 municípios atingidos, em 2005, 144, em 2006, 61, em 2008, 64, em 2009, 125. Em 2012 foram 381 e em 2018, 41 municípios afetados. No período 2019/20, já são mais de 380 municípios que decretaram situação de emergência devido aos enormes prejuízos na produção agropecuária e em restrições de consumo de água nas cidades atingidas.

Pode dizer, que as estiagens recorrentes vêm se transformando em uma espécie de indústria, que alimenta e justifica alguns setores sociais e políticos por meio de medidas paliativas. Quase sempre são os mesmos, especializados em denunciar e criminalizar a legislação ambiental existente, enfatizando a sua ineficácia e inadequação, como se a contínua perda de proteção legislativa dos bens e ativos naturais não tivessem uma relação direta com as crises e adventos climáticos. O debate travado no Congresso Nacional a respeito das mudanças no antigo Código Florestal Brasileiro, exemplificou com sobras de argumentos esse fato.

É fato que os efeitos das estiagens poderiam ser minimizados, desde que para tal, fossem aplicadas as políticas estruturantes e consistentes de gestão, recuperação, tratamento e a manutenção de recursos hídricos que deveriam receber a atenção política e o financiamento devidos. A lei sobre recursos hídricos do Rio Grande do Sul que está em vigor, e é considerada uma das melhores do mundo. Contudo, não se efetiva, devido a percepção equivocada da sociedade e dos governos, que o cumprimento sistemática da legislação ambiental atrapalha a implantação e o desenvolvimento das atividades produtivas na indústria e na agropecuária.

No caso de Erechim, uma cidade considerada rica (PIB per capita de R$ 41.645,00, segundo dados do SEBRAE), e possuidora de boa infraestrutura. Porém os dados de 2018 informaram que 42% da água encanada se perde por deficiências na tubulação, erros de leitura de hidrômetros ou por roubos e fraudes dos consumidores. Por outro, lado 71% das habitações tem ligações sanitárias, mas a cidade não tem sistema público de coleta e tratamento de esgoto. Esses fatores combinados têm impactos expressivos na disponibilidade, no uso e na qualidade da água, que pioram significativamente em períodos de escassez.

Dessa forma, as iniciativas mesmo que necessárias, mas que são focadas apenas nas necessidades de ampliar a captação, não são suficientes e nem sustentáveis em curto, médio e longo prazos. É urgente conectar as necessidades de abastecimento de água urbana com a capacidade de recuperar e manter os mananciais das bacias hidrográficas. E isso diz respeito de modo urgente às necessidades de recuperação e de manutenção de áreas de proteção permanente (APP) e de reserva legal (RL) das propriedades rurais.

Em estudo recente realizado no curso de mestrado em Ciência e Tecnologia Ambiental da UFFS, mostro que o passivo ambiental dos estabelecimentos rurais investigados na região do Alto Uruguai, é expressivo, na medida em que em 68,5% deles, foi encontrada algum tipo de irregularidade inscrita no Cadastro Ambiental Rural (CAR), sendo 29,6% deles apresentaram inconformidade com a APP, e 38,9% com áreas de RL que são inferiores aos critérios prescritos na lei do Código Florestal de 2012.

Desse modo, as Secretarias Municipais de Meio Ambiente e de Agricultura necessitam atentar para relação das atividades agropecuárias com a produção, recuperação de manutenção dos recursos hídricos, por meio de políticas de fomento e financiamento, para apoiar programas de pagamento de serviços ambientais (PSA). A tarefa de proteção e conservação dos bens e ativos ambientais, não deve ser de responsabilidade exclusivamente dos agricultores. Afinal, a conservação dos recursos naturais se torna um bem coletivo.

Iniciativas existem. Um exemplo bem-sucedido é o que está sendo realizado pelo Projeto Conservador de Águas, executado pela prefeitura municipal de Extrema, em Minas Gerais. O projeto começou com discussões e levantamento de informações e na elaboração dos projetos em 1996. O início das atividades começou em 2005, por meio da institucionalização do programa por meio de lei municipal. Durante esses 15 anos foram plantadas mais de 1,6 milhão de árvores de várias espécies nativas, em área para recuperação de mananciais. Foram 224 contratos efetivados em propriedades rurais beneficiadas com o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), 264.335 mil metros de cercas construídas, implantação de mais de 1000 bacias de contenção de águas pluviais e 40.000 metros de terraços de conservação de solos.

Na verdade, as soluções existem, mas é necessário que os representantes políticos se deem por conta, que é necessário fazer mais que o trivial, e urgente promover mudanças estruturais, inclusive utilizando da melhor forma os recursos humanos e financeiros existentes. Por outro lado, a sociedade não deve ficar esperando soluções milagrosas, é preciso se inteirar dos assuntos que dizem respeito ao destino da cidade, para além da cobrança pontual expressa na grita geral, quando os serviços não são prestados.

Vai ter eleição esse ano, e é uma boa oportunidade para votar em propostas que auxiliem a melhorar a cidade e que não sejam apenas para ganhar os cargos disputados.

Eliziário Toledo

Sociólogo, mestre em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS, 2009), doutor em Desenvolvimento Sustentável (CDS-UnB, 2017), mestre em Ciência e Tecnologia Ambiental (UFFS, 2019).

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