Dólar sobe pelo quinto ano seguido e acumula alta de quase 7,5% em 2021

Em 2021, o dólar registrou alta anual pela quinta vez seguida. Com o resultado do pregão desta quinta-feira (30), a moeda americana acumulou valorização de 7,47% no ano em relação ao real.

A última vez que o dólar teve um recuo anual foi no fechamento de 2016, quando terminou o ano com queda de 17,69%.

Mas é importante ressaltar que a base de comparação naquele ano era bastante alta após o conturbado processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), fato político que impulsionou uma alta de 48,4% do dólar em 2015.

O referencial altíssimo ajudou com que houvesse em 2016 a primeira desvalorização da moeda dos Estados Unidos em relação ao real desde 2010.

De lá para cá, foram cinco novas altas de 2017 a 2021. E, desta vez, nem mesmo os quase 30% de alta do dólar em 2020 frearam o ímpeto de subida.

Veja abaixo quanto o dólar acumulou a cada ano.

2017: alta de 1,99%;
2018: alta de 16,92%;
2019: alta de 3,50%;
2020: alta de 29,36%;
2021: alta de 7,47%.

Pandemia e as contas públicas

O primeiro boletim Focus do ano previa que o câmbio terminaria o ano de 2021 em R$ 5 por dólar. Seria, portanto, um cenário de redução comparado com os R$ 5,1872 do fechamento de dezembro do ano passado.

As projeções do mercado financeiro não se confirmaram porque houve uma acentuação da crise nas contas públicas, uma frustração das expectativas de crescimento do país e uma contínua instabilidade política em Brasília.

O orçamento público ficou ainda mais combalido desde a pandemia do coronavírus. O governo de Jair Bolsonaro (PL) foi obrigado a engolir um déficit primário recorde de quase R$ 750 bilhões em 2020.

Só em despesas com a Covid-19, foram gastos cerca de R$ 540 bilhões de acordo com o Tesouro Nacional. Nesse cenário, a dívida bruta do setor público brasileiro avançou 15 pontos percentuais em 2020, para 89,3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Também na virada do ano, a taxa básica de juros do país, a Selic, seguia em 2% ao ano. A deterioração das contas públicas e juros em mínimas históricas diminui o que o mercado financeiro chama de “prêmio de risco”.

Em outras palavras, colocar dinheiro nos títulos do Tesouro, por exemplo, traz pouco ganho financeiro enquanto o endividamento do país cresce rápido — o que ameaça o próprio pagamento desses títulos.

Os dólares, portanto, ficam mais propensos a sair do país em busca de títulos mais seguros. É quando a cotação sobe.

Dólar sobe

Essa era a fotografia do País para iniciar o ano de 2021. E a diminuição do prêmio de risco do Brasil seria mais aceita pelos investidores se o país tivesse demonstrativo de que tinha um plano para arrumar as contas públicas.

O que aconteceu foi o inverso. Dali em diante, dois episódios agravaram a situação.

A segunda onda da Covid-19 ampliou o impulso fiscal para financiar, por exemplo, a nova rodada do Auxílio Emergencial. Pairavam dúvidas sobre como seria financiado o programa, pois a equipe econômica era contra uma nova declaração de estado de calamidade — medida que permitiu o estouro de gastos durante a pandemia.

A aposta era a aprovação da PEC Emergencial, que destravaria os recursos. E a proposta andava lentamente. Somado a isso, havia uma briga no Congresso Nacional em torno do Orçamento de 2021, que não havia sido aprovado no ano anterior como de costume.

Com o país precisando de novo direcionamento de dinheiro para a pandemia, os parlamentares haviam reduzido a previsão de gastos com despesas obrigatórias e aumentado o valor das emendas parlamentares — aquelas que deputados e senadores podem direcionar para os próprios redutos eleitorais.

“O risco-país explodiu ao ver o que se pretendia fazer com o Orçamento logo depois de um ano de déficit primário recorde. Junto, o dólar vinha forte no exterior. Foi o pior momento do câmbio”, lembra Victor Beyruti, economista da Guide Investimentos.

No dia 9 de março, em meio ao impasse, o dólar chegou à sua pior cotação do ano: R$ 5,7919. E houve um fato extra que causou um dos pequenos surtos no mercado em 2021.

No dia anterior, foi publicada a decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, de anular todas as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela Justiça Federal no Paraná relacionadas às investigações da Operação Lava Jato.

Com os processos de volta à estaca zero, Lula deixou para trás a inelegibilidade que carregava pela Lei da Ficha Limpa. E ele lidera as intenções de voto nas pesquisas para presidente nas eleições de 2022.

Na visão do mercado financeiro, um eventual governo Lula teria potencial de ampliar gastos públicos em um Orçamento combalido.

Em geral, esse é o mecanismo. Sempre que uma agenda mais “fiscalista” — de corte ou redução de gastos — prevalece, o risco-país diminui e os dólares voltam a entrar.

Dólar cai, mas logo sobe

Do pior momento, o dólar embalou uma queda expressiva conforme a vacinação contra a Covid-19 acelerava e o Banco Central do Brasil iniciava o ciclo de alta dos juros. Para os investidores, a imunização representa menos restrições à economia. Os juros mais altos elevam o prêmio de risco.

No dia 24 de junho, menos de quatro meses depois do recorde nominal do dólar, o câmbio chegou ao menor valor no ano: R$ 4,9034.

De junho em diante, o dólar engatou novamente o curso de alta pois as notícias positivas se esgotaram. Em sequência, houve a descoberta da variante delta do coronavírus, o debate sobre a PEC dos precatórios, o furo do teto de gastos, a chegada da variante ômicron e, por fim, os indicativos de alta de juros nos Estados Unidos. Tudo regado às crises políticas renovadas constantemente pelo presidente Bolsonaro, cujas ameaças golpistas criavam mais tensão entre os poderes.

Primeiro a delta e depois a ômicron causaram calafrios nos investidores, que temem bloqueios à economia semelhantes àqueles dos primeiros dias de pandemia. A aversão a risco leva investidores para ativos mais seguros.

No Brasil, a delta teve efeitos relativamente brandos graças à vacinação avançada. A ômicron é recém-chegada e ainda se estudam os efeitos. Mas os solavancos de dúvida no exterior impactam toda a economia global.

E ainda na linha do problema com as contas públicas, pegou mal para o mercado o mecanismo de financiamento do Auxílio Brasil, novo programa social que substituiu o Bolsa Família, por fora do teto de gastos.

O programa custará em torno de R$ 84,7 bilhões em 2022, segundo o Tesouro. Para financiá-lo, o governo desagradou o mercado quando trabalhou para aprovar a PEC dos precatórios.

Depois da tramitação no Congresso, a medida liberou R$ 106 bilhões por meio de um teto com essas dívidas de decisão judicial sem possibilidade de recurso e uma mudança da base de cálculo do teto de gastos, que amplia a fatia para gasto público em ano eleitoral.

Esse “drible” no teto foi encampado inclusive pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, a quem agentes do mercado confiavam a imposição de uma agenda de controle rígido das finanças do país.

Enquanto isso, nos EUA…

No Brasil, a crise fiscal e a instabilidade política imperam para definir a cotação do dólar. Mas há uma pressão externa que mostrou os primeiros sinais em meados de 2021 e deve se intensificar no ano que vem: o aperto monetário por parte do Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos.

A pandemia obrigou os bancos centrais a reduzir juros e dar empuxo financeiro aos países para recuperar suas economias. As principais medidas foram transferências diretas à população e apoio às empresas para que não quebrassem.

Enquanto as políticas monetárias ficaram mais frouxas, o coronavírus também desorganizou as cadeias produtivas em todo o mundo, causando crise de oferta em diversos setores. O resultado foi inflação global.

No Brasil, um dos exemplos mais latentes foi o mercado automotivo. Houve paralisação da produção por conta do vírus, falta de peças e semicondutores, junto com aumento do preço de insumos. A soma dos fatores atrapalhou a produção e entrega de carros novos, aumentando a procura por usados.

Mas mesmo economias desenvolvidas se desorganizaram. Nos Estados Unidos, a inflação ao consumidor chegou perto dos 7%, o que obrigou o Fed a reverter as políticas de incentivo à economia.

E isso significa aumento dos juros norte-americanos, da atual faixa de 0% a 0,25% ao ano. Títulos americanos com rentabilidade mais alta atraem o capital de investidores para o que se consideram os ativos mais seguros do mundo.

Novamente, o dólar se fortalece, mas, desta vez, contra todas as moedas e não só o real. É a nova pressão que países emergentes enfrentarão em 2022.

Para Kiran Kowshik, estrategista de câmbio do banco Lombard Odier, o Brasil e os demais países emergentes têm sofrido além do comum nos últimos anos para gerar um diferencial de crescimento de atividade econômica. O principal vetor é a desaceleração de economias importadoras de commodities, como a China.

Em outras palavras: nos momentos em que o dólar se fortalece, as moedas de todos os emergentes sofre desvalorização mais intensa e têm muita dificuldade para se recuperar.

Segundo o economista, o ambiente atual — de retorno da inflação que prejudica o crescimento global, em que o Fed está mais contracionista e há um choque em preços de energia —, há um inevitável desvio de fluxo de capital para o dólar.

“É um desafio que atinge a todos os emergentes, mas o Brasil tem como agravante uma crise fiscal muito séria. É um endividamento maior que economias semelhantes, sem plano de saída e com uma perspectiva de crescimento muito baixo”, diz Kowshik.

Fonte: O Sul

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