De papo para o ar e pés na cadeira

Toda forma de expressão artística me encanta. A música, apesar de atualmente não ouvir muito, me agrada aos ouvidos, confesso que não sou dada a todos os gêneros musicais. Ao ouvir certos artistas fico me perguntando quem definiu que o que cantam é música. Bem que dizem por aí que há gosto para tudo e que gostos não se deve discutir, me parece que caberia discussão sim, mas o lucro por vezes fala mais alto que talento artístico.

Me lembrei de uma aluna que ao levar para a aula uma música clássica, me falou “essa música tocou minha alma, professora”. Tocar a alma, chegar ao mais íntimo de nós mesmos, nos fazer descobrir sensações e emoções desconhecidas, a música tem essa capacidade de nos tocar profundamente se estivermos atentos e se nos permitirmos sentir, talvez qualquer música faça isso, até as que critico acima.

Estive na apresentação da Orquestra Municipal de Erechim. Enquanto aguardava o início da apresentação me distrai com meus pensamentos dos tempos idos em que cantava no coral da Universidade de Passo Fundo e ganhava desconto na mensalidade cara de uma faculdade de elite. Cantar e ganhar abatimento nas mensalidades da faculdade, que sábia iniciativa de algum ser que apreciava arte. Lembrei dos tempos após a formatura em que cantei no coral da Universidade de Erechim e gravei dois CD’s, não fiquei famosa, mas minha alma ficou feliz, apesar das exigências do maestro, que por vezes beirava a grosseria. Me distrai entre meu passado de música e meu presente de ausências de cantos em corais, mas sempre que posso aprecio.

Ao olhar para minha esquerda na fileira de cadeiras a minha frente haviam algumas pessoas, me chamou a atenção uma adolescente que colocou seus pés apoiados na cadeira da fila da frente. Me mexi na cadeira com vontade de mandar ela tirar seus lindos pezinhos do encosto, mas entre me mexer e remexer, um senhor próximo a ela tocou o ombro da criatura sem educação e pediu gentilmente para que retirasse os pés da cadeira, ela o fez. Quando o fato ocorreu, pensei ela vai jogar de balde pedras no senhor que falou, mas não, silenciosamente retirou seus pezinhos e os acomodou no chão, talvez pensando que não estivesse realizando uma conduta errada.

Várias pessoas que viram a cena acontecer o apoiaram fazendo gestos positivos e aplaudindo.

Ao refletir sobre o fato e falar com um bando de gente sobre isso, me questiono o porquê esta criatura que se encaminha para a fase adulta ainda não entendeu que em qualquer lugar temos que ter certas posturas. Que lugar público não é nossa casa. E mesmo que estejamos em casa não é dessa forma que devemos nos portar, dificilmente colocamos os pés no encosto da cadeira, pelo menos não deveríamos. Os pais dessa figura que porta a má educação não lhe disseram nada durante o curso de seu desenvolvimento e se disseram talvez ela não tenha entendido, pois faz parte da geração que não dá nada, tudo pode.

Ou talvez os pais sejam daquela filosofia que não se deve contrariar os filhos, que eles podem fazer o que e como desejam. Isso tem se refletido nas sociedades como um todo, pois todo brasileiro acha que pode fazer o que bem entende, uma sociedade apenas de direitos dá nisto. E os deveres ficam para quem?

Qual nossa parcela para mudar a sociedade que se degringola a cada segundo? Não haverá um fiscal para cada Brasileiro se comportar corretamente.

Ouvi uma história de que na Universidade no Canadá toda arrumadinha e sem riscos, minha amiga passava por uma parede que estava riscada e a sua acompanhante canadense comentou que certamente os riscos haviam sido feitos por brasileiros. Fiquei triste ao ouvir que nossa fama ultrapassou fronteiras internacionais, mas também não duvidei da possibilidade de que realmente a versão da história era verdadeira, visto como tratamos os bens públicos em nosso país.

A apresentação foi muito bonita, as instrumentistas estavam em elegantes vestidos coloridos doados por um grupo de mulheres do Rotary. A apresentação preencheu olhos e ouvidos de luz, cor, som e melodias natalinas.

Entre a espera pela apresentação de uma bela noite de aquecer a alma e deixar ela mais gordinha de sons que me alegraram e deixaram mais colorida, tinha um barulho, com cara de ruído que não gostei de ouvir e ver. Barulho da má educação me incomoda profundamente e todos somos responsáveis para bater no ombro do outro e dizer que sua atitude está errada, mesmo que para isso compremos brigas, algumas valem a pena, outras não.

Precisamos fazer escolhas o tempo todo, eu não briguei naquela noite, mas apoiei quem o fez. Talvez isso não mude um país que entendeu que podemos colocar os pés na cadeira, mas são nos pequenos gestos que precisamos começar com urgência, já está passando do tempo.

Por Maria Emília Bottini

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