Trabalho, superação e amor a tradição: 90 anos do Grupo Gillé

Na última semana, os microfones da Rádio Cultura registraram a história viva dos italianos, contada por cinco integrantes do Grupo Gillé. Este ano o grupo comemora 90 anos de existência, uma trajetória que se confunde com o centenário de Erechim. Os imigrantes italianos aqui chegados venceram a si próprios e a natureza adversa. No início da colonização em Erechim, 90% da população era descendente de italianos, tanto na cidade, como no interior. Muitos vieram diretamente da Itália, especialmente da região de Vêneto. A maioria em busca de uma vida melhor para si e seus filhos.

Três setes, quatrilho, cantaria e vinho

A história de trabalho, perseverança, superação e amor a tradição italiana, deu origem ao Gillé, inicialmente uma entidade amadora no ano de 1928. O professor Demarco, um dos integrantes mais antigos conta que “naquela época não havia rádio, TV ou jornal, Erechim era muito pequeno, então, nos sábados a noite os amigos se reuniam na casa de um ou outro, para jogar três setes, quatrilho e principalmente cantar. Todos estes encontros regados a um bom vinho. Naquela época, se fazia vinho bom, se era para fazer vinho, tinha que ser no capricho. Para os outros não precisava ser tão especial, mas para si, tinha que ser o melhor. As pessoas se esforçavam ao máximo para fazer o melhor vinho e comentavam, na casa do fulano de tal tem vinho caprichado. A bebida é tão antiga que na bíblia até se fala na história de Noé, no qual foi registrado o primeiro porre de vinho. Hoje com a colonização, onde existe italiano, existe vinho”, contou.

“Aparelhagem de São Paulo para gravar uma fita cassete”

Esses encontros ocorriam com frequência na casa de Giordo Corradi e quem comandava a cantoria era Nei Miolo. Um dos líderes da turma sempre alegre e expansivo era Atílio Pagliosa, que inclusive foi o primeiro presidente do Grupo Gillé. No início era um coral de vozes masculinas, apaixonado pelo canto italiano. O amor pelo canto era tão grande que o pai de Hildegart Durli, alemão, ficou encantado. Emprestava a casa para os ensaios e garantia os garrafões de vinho. “Meu pai gostava tanto que comprou uma aparelhagem de São Paulo para gravar uma fita cassete dos cantos. Alemão, sem entender uma palavra em italiano, gostava de ouvir a cantoria”, relatou. Hildegart caminha lado a lado com o Gillé a 38 anos, seu esposo era uma das vozes do coral e ela, é uma das responsáveis pela culinária. Nos eventos, auxilia no preparo dos pratos típicos.

Grupo del Cavicchio

As cantorias eram sempre acompanhadas de um filó e o grupo começou a ficar conhecido e realizar apresentações na região, animar festas e casamentos. No decorrer dos anos começou a usar fatiota, colete (gillé em italiano) e chapéu de feltro, dando personalidade e uniformidade ao grupo. No entanto, conforme conta o vice-presidente e também integrante, Natalino Oldra, inicialmente o grupo se chamava Cavicchio. “A partir de um fato inusitado na abertura de uma pipa de vinho, a turma de cantoria ficou conhecida por Grupo del Cavicchio. Depois passou a se denominar Turma do Gillé e finalmente, Grupo Gillé”.

O grupo dos homens

Em 30 de abril de 1969, coincidentemente no aniversário do município, o grupo foi oficializado com estatuto próprio. Desde então fez muito sucesso com a missa italiana cantada em três vozes. Já no ano de 2002, vozes femininas passaram a enriquecer o coral. Alcir Luiz Bordin canta a 18 anos e ainda conserva os costumes. “Além dos cantos, é um encontro de amigos e famílias. Encontramo-nos todas as semanas para os ensaios e antes, colocamos a conversa em dia. Também temos o grupo dos homens como era antigamente, todas as sextas-feiras nos reunimos”.

“O Gillé é o resgate da história italiana”

Além do canto, a gastronomia e costumes sempre estiveram presentes na vida do Gillé. Roseli Adami Tobaldini, a primeira mulher a presidir o grupo, diz que o Gillé conta com nove décadas de uma rica história italiana. “O Gillé é o resgate da história italiana. Num primeiro momento era um grupo bem fechado, só participavam homens. Hoje temos os homens com suas raízes, mas também as novas gerações e simpatizantes com a cultura. Acolhemos todas as pessoas amantes do canto italiano. O Grupo do Gillé hoje é misto, canto/coral. Nos mantemos com a culinária, a grande festa da polenta, porchetta e tantas outras delícias. Fica aqui um convite, se você gosta de cantar, canta com o coração, não precisa falar italiano, vem participar do Gillé”, finalizou.

Por Carla Emanuele