TANQUE DE GUERRA: UM “BELO” CARTÃO POSTAL?

Na Praça Boleslau Skorupski, popularmente conhecida por “Praça do Tanque” ecoam sussurros de uma história não tão antiga, é onde dorme um tanque de guerra que conta segredos de uma batalha. O Carro de Combate X-1 foi uma homenagem ao aniversário de 25 anos da Associação dos Reservistas de Erechim, em 24 de abril de 2005. Pelo fato de ser uma história tão próxima de nós, por que não procuramos novas percepções sobre o que está naturalizado em nosso cotidiano?

Em 2019, foi solicitado um pedido de limpeza e conservação do monumento “tanque”, requerida com urgência a fim de preservar este belo cartão postal que está no coração de nossa cidade[1]. Se pararmos para olhar o dicionário, descobrimos que um cartão postal é “uma forma de saudação ou lembrança de um lugar visitado”, permitam-me indagar: como Erexim quer ser lembrada pelos viajantes que por aqui passam com este belo cartão postal?

Um monumento exposto no coração da cidade não é apenas estético (para apenas se ver e admirar), mas tem significados políticos, um jeito de se posicionar e contar um lado da história. A memória desenterrada que o tanque de guerra provoca pode trazer falsas lembranças apoiada em uma recordação equivocada da guerra e do nacionalismo. A relação entre o nacionalismo e o monumento histórico é muito conectada, de maneira que vemos aquele tanque e estamos acostumados com uma visão bela e de união do povo para a luta.

Isso cria um falso nacionalismo, pois “a nação reconhece-se antes de mais pela história em comum”[2], e uma das consequências de pensar a nação assim é como a história está sendo contada, há “um processo de engrandecimento. Eis mais uma razão para a anomalia dos movimentos puramente autónomos e separatistas […]”[3], como aconteceu no Rio Grande do Sul na Guerra dos Farrapos, é uma unificação popular tão grande que a guerra vira um símbolo de glória.

Então pouco se pergunta sobre o significado desse monumento, é apenas a Praça do Tanque, mas devemos utilizar da curiosidade característica do ser humano para começar a questionar. Por que fomos à guerra? “Por que um país situado na periferia do mundo e sem política externa agressiva entrou nessa guerra?”[4] Quais foram as consequências? O que estamos evidenciando aos nossos turistas e a nossa população com o nosso cartão postal?

Fica claro que a imagem/monumento[5] tem a mesma função da palavra e da escrita, ou seja, também pode transmitir em massa (para toda a população) todos os poderes e influências que quiser, se mal entendidas ou interpretadas. “As vozes humanas falam de muitas maneiras – perguntas, afirmações, generalizações, imagens […]”[6] e esse papel artístico que guarda a cultura de uma cidade em seus monumentos têm funções quase que educativas, pois já dizem alguma coisa antes mesmo de se falar.

Entre Aspas

Os monumentos históricos são intocáveis e deveríamos evitar qualquer intervenção nos mesmos? Quando um monumento é instalado em um local público, há ali uma disputa de imagens que tentam ganhar espaço na história desse determinado local. Quando os tempos contemporâneos chegam com a diversidade cultural, educacional e política torna-se tendencioso que algumas representações continuem em local público sem uma revisão desse processo de homenagens, assunto que tem recebido atenção em debates frequentes.

O texto aqui escrito não se coloca contra o setor militar, o qual desempenha um papel fundamental na construção nacional, no entanto, estamos questionando a cultura de guerra, em detrimento da cultura da paz, presente em nossa sociedade.

Kaylani Dal Medico

Discente do Curso de Licenciatura em Pedagogia da UFFS Erechim.

Bolsista do Projeto de Extensão “Dizer a sua palavra”: democratização da cultura popular e da comunicação

kaylanidalmedico@hotmail.com

[1] Plenário da Câmara de Vereadores de Erechim, 27 de agosto de 2019. https://sapl.erechim.rs.leg.br/media/sapl/public/materialegislativa/2019/20583/pp-limpeza_do_tanque_e_conservacao_do_monumento.pdf

[2] HOBSBAWM, Eric. Nações e nacionalismo. Ler história, n. 5, p. 17-25, 1985. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=8966039

[3] Idem.

[4] FERRAZ, Francisco César Alves. Os brasileiros e a segunda guerra mundial. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

[5] CORRÊA, Alexandre Fernandes. Guerra das imagens e memórias enxertadas: monumentos, museus e memórias históricas em conflito. Disponível em: http://www.adaltech.com.br/anais/sociologia2017/resumos/PDF-eposter-trab-aceito-0921-1.pdf

[6] FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. 15. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021. Grifo nosso.

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