Em cenário marcado por certa normalização nas atividades, três dos principais setores da economia fecharam o ano no azul no Rio Grande do Sul. O setor de serviços consolidou o maior avanço percentual em 2022 – por ter reagido mais tarde – , na casa dos dois dígitos. Na sequência, figuram o comércio e a indústria, que anotou o resultado mais tímido. Os dados são parte de pesquisas mensais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgadas na semana passada.
Peso de bases de comparação diferentes, troca de bens por serviços pelo consumidor e pressão causada pelo juro alto são alguns dos fatores que explicam os movimentos. Cautela em meio à falta de informações sobre política fiscal e Selic em patamar elevado aumentam as incertezas sobre o desempenho nos próximos meses, segundo especialistas.
Motor da economia e da geração de emprego no país, o setor de serviços no RS cresceu 11,3% no volume em 2022 ante 2021. Em dezembro, avançou 0,8% em relação ao mês anterior. No acumulado do ano passado, os serviços prestados às famílias (que incluem alimentação fora de casa), apresentaram o maior avanço entre os segmentos.
Economista-chefe da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) da Capital, Oscar Frank avalia que expansão por demanda reprimida, normalização na mobilidade e substituição do consumo de bens por serviços ajudam a explicar o desempenho do setor:
– Os serviços prestados às famílias foram alguns dos segmentos que mais sofreram com o distanciamento social. São restaurantes, hotéis e turismo. E houve reativação bem expressiva nessa área ao longo do último ano porque o quadro sanitário melhorou ao longo de 2022.
Por ser um setor muito dependente da renda das famílias, o avanço na geração de emprego é outro fator que beneficiou os serviços, segundo Frank. Ele também destaca avanço nos grupos de informação e de transportes, impulsionado pelo escoamento das vendas online, no resultado.
No comércio varejista, o volume de vendas cresceu 7,1% no Estado em 2022. Em dezembro, caiu 2,5%. No total do ano passado, o comércio de combustíveis, vestuário e de alimentos são destaques. Frank avalia que os números do comércio na pesquisa do IBGE não refletem a realidade do setor, principalmente o salto observado em março do ano passado. O economista ressalva que áreas mais ligadas à renda, como a de supermercados e vestuário, performaram melhor. Já ramos dependentes do crédito, como o de eletrodomésticos, não apresentaram bons resultados em um ambiente de taxa Selic elevada.
Histórico
A indústria apresentou o menor avanço entre os três setores, com alta de 1,1% no Estado em 2022, sempre na comparação com o ano anterior. Em dezembro, a produção física do setor avançou 1%. A economista Maria Carolina Gullo, professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), diz que a indústria começou a retomada mais cedo, portanto tem o resultado do ano passado comparado com base mais forte:
– Esse 1,1% da indústria fica parecendo um resultado ruim quando comparado com comércio e serviços, mas, na verdade, esse avanço menor ocorre em razão de uma base mais forte da indústria. Foi o setor que saiu primeiro da crise e mostrou fôlego já a partir de 2020 – salienta Maria Carolina.
Por segmento nas fábricas, veículos automotores, reboques e carrocerias e máquinas e equipamentos apresentaram as maiores altas. Melhora na oferta de insumos, retomada de demanda reprimida e bons números em máquinas agrícolas ajudam a explicar esse movimento, avalia ela. A fabricação de móveis apresentou a queda mais acentuada. O segmento teve resultados expressivos durante o ano anterior, o que elevou a base de comparação, dificultando avanços em 2022.
Incertezas no horizonte
Mesmo em alta, os setores seguem mostrando sinais de desaceleração em dados de 2022. Em parte, o movimento é explicado pelas bases de comparação. Conforme a retomada avança, o espaço para recuperar diminui, o que impacta os percentuais. Essa acomodação, somada às incertezas sobre o rumo da atividade econômica nos próximos meses aumenta a nebulosidade em estimativas de desempenho dos segmentos em um futuro próximo, segundo especialistas.
O aumento de riscos na economia do país – resultado da falta de clareza sobre a política fiscal do governo federal e tensão entre a atual gestão do Planalto e o Banco Central – piora as expectativas de inflação, segundo o economista-chefe da CDL Porto Alegre, Oscar Frank. Ele reforça que esses fatores mantêm a perspectiva de taxa básica de juro elevada por período maior, o que prejudica a atividade de serviços e comércio. Além disso, redução da poupança das famílias e diminuição da demanda reprimida completam o cenário, segundo o economista:
– A tendência é de dificuldade para gerar um crescimento mais expressivo por conta de todas essas situações.
A professora Maria Carolina Gullo, da UCS, estima um primeiro semestre marcado por cautela por parte dos empresários, no aguardo das primeiras ações concretas do governo federal. A economista avalia que há espaço para avanço na atividade na segunda metade do ano caso alguns temas importantes, como a reforma tributária, avancem. Maria Carolina destaca problemas particulares que podem afetar o desempenho do Rio Grande do Sul, como a estiagem:
– Essa é uma preocupação: como o agronegócio vai reagir aos efeitos da estiagem. Também tem a expectativa de como vai ser a recomposição das receitas do governo estadual com as perdas de arrecadação de ICMS.