Na noite do último 18 de setembro, fui avisado de que a Brigada Militar havia realizado algumas prisões e apreendido armas e drogas. Caso houvesse interesse de realizar a cobertura, era para eu deslocar até a Delegacia de Polícia. Certamente havia interesse de minha parte, certamente que desloquei, e me lá me deparei com uma das maiores apreensões de drogas realizadas este ano em Erechim.
Na ação os policiais prenderam três adultos, apreenderam um adolescente, 70 quilos de maconha e menores quantidades de crack e cocaína. Também haviam encontrado dois carros clonados, um fuzil 765, duas espingardas, calibre 12, duas pistolas, dois revólveres, farta munição, dinheiro, camisas com estampas da Polícia Civil, um colete à prova de balas, um giroflex de viatura policial, celulares, balanças de precisão e um par de algemas, mas em meio a todo esse material, o que realmente me chamou atenção foram duas sacolas com centenas de cápsulas de plástico com forma e tamanho semelhantes a tampa de uma caneta bic, com marcações de dosagem na lateral, igual aqueles copinhos para tomar xarope. Em uma sacola estavam as de cor escura e em outra, as de cor azul e maiores.
Rio de Janeiro e São Paulo
Nunca havia visto aqueles objetos por aqui e pouco depois, descobri que os policiais da região também não haviam visto, mas sabiam o que era. “São ‘pinos’ para vender doses de cocaína. Facilitam para que o traficante ou o usuário jogue fora em caso de aproximação policial, são à prova d’água, mais fácil de esconder e permitem a comercialização de doses mais precisas da droga. Por aqui (Erechim e região) os traficantes costumam vender doses de cocaína embaladas em saquinhos, mas os ‘pinos’ são bastante comuns no Rio de Janeiro e São Paulo. Acredito que estas (apreendidas), tenham vindo de lá. Essa é a primeira vez que acontece uma apreensão de ‘pinos’ em Erechim”, me relatou um policial civil.
Cápsulas
As cápsulas plásticas surgiram no Rio de Janeiro em 2012. A primeira vez que foram encontradas pela polícia foi durante operação para libertar bombeiros sequestrados por criminosos em Manguinhos, no subúrbio da cidade. “Apreendemos sacos e sacos dessas cápsulas. Antes, eles usavam saquinhos de plástico para embalar cocaína. Agora, estão se especializando”, ressaltou à época um policial militar durante entrevista ao site G1.
Cocaína
Gosto de deixar claro em minhas colunas e textos que não sou nenhum especialista em segurança pública, longe disso, mas nestes cerca de 20 anos cobrindo o setor, aprendi a observar, notar certos padrões e diferenças em crimes da mesma natureza. Semanas atrás escrevi que chamava atenção um aparente aumento na quantidade de cocaína na região, entorpecente conhecido por ser consumido por um público de maior poder aquisitivo. Até poucos meses, as batidas em pontos de tráfico geralmente resultavam na apreensão de maconha e crack, às vezes algumas buchinhas de cocaína, mas desde julho se percebe uma inversão. No mês citado, a quantidade de cocaína apreendida pela polícia superou a de crack, foram mais de dois quilos, e desde então, raramente ocorreu alguma ação policial onde não fosse encontrada cocaína, isso sem contar os registros por posse, realizados durante patrulhamentos de rotina.
Então, me parece, que o mercado das drogas em Erechim e no Alto Uruguai, anda atraindo “investidores” de fora, de grandes centros, talvez até de outros estados. Situação um tanto quanto preocupante, já que nestes locais o tráfico costuma ser comandado por facções organizadas, violentas e fortemente armadas.
Recrutados?
Após analisar por este lado o resultado da ação ocorrida no dia 18, parei para observar o restante. Talvez eu seja um adepto de teorias da conspiração e até esteja exagerando, mas considero que é melhor prevenir do que remediar. Vamos lá. Os presos estavam com giroflex de viatura policial, camisas com estampas da Polícia Civil, armas longas e de grosso calibre, carros clonados, tudo estocado em um casebre no bairro Agrícola que possivelmente servia como depósito para o material e base para os criminosos.
Acredito que para contar e usar tamanho aparato, precisariam de experiência e uma generosa quantia de dinheiro, mas os presos na data, pelo menos até onde pude apurar nas primeiras informações divulgadas, ainda com a ocorrência em andamento, não tinham nem um nem outro, possuíam passagens apenas por crimes de menor potencial ofensivo, como posse de drogas. Pensei: será que haveria a possibilidade de eles estarem sendo recrutados por outros, mais perigosos, talvez de outros pontos do estado ou do país? Não tenho dúvida que pela quantidade de drogas apreendidas em Erechim, o número de usuários é grande e o mercado extremamente lucrativo.
Também não tenho dúvida sobre a competência e bons resultados das nossas polícias, mas sabemos sobre o déficit de efetivo que afeta o Alto Uruguai e basicamente, todo o país, então, apesar de todo esforço e união dos nossos órgãos de segurança, imaginem a dificuldade para atender cerca de 40 municípios (o 13º BPM e a 11ª Delegacia Regional de Polícia Civil cobrem mais cidades além das que integram a região da AMAU) espalhados em um território que possui mais de 8.208.75 km², faz fronteira com outro estado e possui dezenas de rotas de fuga, que formam um enorme labirinto cercado de matas.
Essa semana o presidente do Consepro, Miguel Gotler, divulgou uma boa notícia. O governo do Estado convocou dois mil aprovados em concurso público da Brigada Militar para iniciar em novembro, curso de formação. Destes, uma turma de aproximadamente 30 soldados devem realizar o treinamento em Erechim. A torcida agora é para que a informação se concretize, e mais, que após a formação, estes permaneçam no Alto Uruguai e não sejam convocados para outras regiões.
Por Alan Dias