PERGUNTARAM-ME: DESAFIOS DA DOCÊNCIA NA ATUALIDADE, TRABALHO DO PROFESSOR E PANDEMIA

É mais fácil perguntar do que responder. A indagação surge quase que espontaneamente ao depararmo-nos com situações que aguçam a curiosidade e/ou provocam espantos. Em contrapartida, a solução da provocação exige, no mínimo, capacidade de entendimento, interpretação e ação.

Compreender o teor e a intenção da indagação, bem como, adotar procedimentos reflexivos constituem-se em elementos primordiais para construir respostas que não sejam rasas e triviais.

A pandemia em curso de covid-19, que é uma doença respiratória aguda, além de impactar diferentes setores da sociedade, causa espanto, preocupações e indagações de diferente natureza, não apenas na tentativa de elucidar essa situação problema, mas também para diminuir a angústia, a aflição, o assombro gerado por tal adversidade. E nesse contexto foram-me dirigidas duas provocações, de não tão simples solução, assim formuladas: “De maneira geral, apresente os principais desafios da profissão [docente] atualmente.”; “Como a pandemia alterou a rotina de trabalho do professor? Destaque os pontos positivos e os negativos dessa alteração.”

Socializo a seguir a primeira tentativa de acalmar meu espanto, pois as perguntas cessam de incomodar, de “tirar o sono” a partir do momento que são respondidas.

O primeiro ponto a ser elucidado relaciona-se ao entendimento do termo desafio, pois desafiar faz referência a competir, a incitar, a provocar, a despertar… Então prefiro pensar elementos que sejam provocadores, estimuladores para a docência e que estão presentes no cenário contemporâneo interligados aos elementos provocativos para/na profissão docente, quais sejam: transformações rápidas e amplas; crescimento da sociedade da informação; facilidade de acesso às informações e ao conhecimento produzido pela humanidade; sociedade aprendente; informatização; virtualidade; novas formas de comunicação; modificações no mercado de trabalho; gestão do conhecimento; problemas sociais e ambientais; incertezas/instabilidades; urbanização; eficiência tecnológica; valorização da diversidade, dentre outros.

Em suma, a sociedade atual está marcada por mudanças que ultrapassam o plano tecnológico e econômico. Portanto, são mudanças estruturais e que sinalizam o processo de edificação, já em andamento, de uma nova civilização. E, diante disso, é possível elencar, resumidamente, alguns “desafios” viáveis à profissão docente: assumir o compromisso para com a constante renovação científica, com a pesquisa, com a aprendizagem, com a curiosidade pelo desconhecido, isto é, pelo novo; construir a relação educador-educando em que se vivencie a participação, a reflexão, o debate, a aprendizagem, a dialogicidade; o docente precisa assumir-se como um profissional do sentido e como um profissional capaz de criar conhecimento e de possibilitar as condições para a sua produção; trabalhar a partir da pergunta, problematizar, provocar, promover, organizar; assumir a educação como um processo relacional; compreender que a mediação no processo educacional se dá pela atitude do docente e pela utilização de recursos diversos; proporcionar ao estudante atividades contextualizadas que possibilitem estimular e desenvolver sua autonomia, bem como, a resolução de problemas; assumir o compromisso com rigorosidade metódica e disciplina intelectual, pois a sala de aula, física ou virtual, não é local para espetáculos.

Acima de tudo, no entanto, entendo que a questão norteadora para iniciativas didático-pedagógicas consiste em ter clareza de que tipo de ser humano precisa-se formar e para que arquétipo de sociedade. Talvez isso sintetize, magistralmente, os “desafios” da profissão docente atualmente.

Em relação à segunda provocação, que se refere à rotina do trabalho do professor versus pandemia, faz-se necessário, primeiro compreender que para trazer à baila questões que impactam, ou de forma positiva ou negativa, o exercício da profissão docente, indubitavelmente, é fundamental que se examine, em primeira instância, a valorização social da profissão (possível tema para outra reflexão).

É um tanto questionável afirmar que a pandemia alterou a rotina do trabalho do professor(a), pois rotina denota o hábito de fazer algo sempre do mesmo modo, mecanicamente. Sabemos (ou todos deveriam saber) que o trabalho docente não é um trabalho mecânico, repetitivo, pois a profissão é exercida com seres humanos, com produção de saberes, de conhecimentos e em contextos multifacetados, exigindo que ação docente seja dinâmica, temporal e espacial.

A pandemia do Covid 19 deverá ser considerada um evento de referência para demarcar um novo período histórico em que foram acentuadas práticas no âmbito profissional diverso, mas que não surgiram por causa desse flagelo. O trabalho remoto e o home office, por exemplo, bem como os recursos tecnológicos necessários para a sua efetivação, já existem a um tempo considerável. O que aconteceu foi a decisão deliberada para a sua utilização de forma mais ampla e intensiva, para dar conta de atividades imprescindíveis, como é o caso no setor educacional, diante da situação pandêmica.

Obviamente que ocorreram redirecionamentos no planejamento, na organização e nas ações no âmbito das instituições educacionais, que foram e são necessários, considerando as medidas de proteção em relação ao novo coronavírus. Elencar pontos positivos e negativos, no estágio atual, considerando esses novos encaminhamentos, considero uma atitude pré-matura e arriscada, pois estamos vivenciando o fenômeno pestilento e seus impactos; além disso, há que se considerar nisso os elementos subjetivos, isto é, o que é “positivo” para um na condição de docente, pode ser “negativo” para outro profissional da educação. Entendo que os esforços devam ser concentrados para conhecer os resultados dessa reconfiguração do fazer educacional institucional, por exemplo, no tocante à aprendizagem, à formação geral e profissional do acadêmico(a), da eficiência e eficácia do trabalho docente, entre outros elementos, para depois, sim, identificar com segurança dados que possam ser considerados positivos ou não.

Não existe apenas uma forma de explicar um fato, um fenômeno, um acontecimento… E considerando essa premissa deduz-se que para uma mesma pergunta é possível construir diversas soluções, pois as respostas estão na dependência das crenças, do conhecimento, da cultura… dos respondentes. Isso posto tenciono que outros se debrucem reflexivamente sobre as interrogações que deram origem a essa elaboração.

Por Idanir Ecco

Mestre em Educação UPF/RS; Professor da URI Erechim/RS. Membro da Academia Erechinense de Letras.  idanir@uricer.edu.br