Após análise das evidências disponíveis, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC, da sigla em inglês), braço da Organização Mundial da Saúde (OMS), decidiu incluir oficialmente o aspartame no grupo 2B referente às substâncias consideradas “possivelmente cancerígenas”. O adoçante artificial é um dos mais utilizados para substituir o açúcar dentro de casa e em produtos “zero”, como refrigerantes e sucos.
Ainda assim, na avaliação de risco, que estabelece o real perigo para o consumidor, o Comitê Conjunto de Especialistas em Aditivos Alimentares da OMS e da Organização para Agricultura e Alimentação (JECFA, da sigla em inglês) decidiu que os estudos atuais não são suficientes para alterar o limite de consumo diário considerado seguro, de 40 mg por kg de peso corporal.
As duas análises, embora feitas de forma colaborativa no caso do aspartame, são independentes. A do IARC apenas identifica as propriedades específicas de um agente e analisa se ele tem ou não potencial para causar um câncer, independentemente da dose, explicou a diretora interina do programa de Monografias da IARC, responsável pelas classificações, Mary Schubauer-Berigan, em coletiva de imprensa.
“(Em relação ao aspartame), isso (foi observado) especificamente para o carcinoma hepatocelular, que é um tipo de câncer de fígado. A evidência, limitada, vem de três estudos compreendendo quatro grandes coortes conduzidos nos Estados Unidos e em 10 países europeus”, disse a especialista.
Os três foram trabalhos epidemiológicos, que observaram a incidência do tumor em uma determinada população durante um tempo, comparando-a com o uso do aspartame por meio de bebidas adocicadas. Os resultados indicaram uma possível relação. Um resumo sobre a decisão foi publicado na revista científica Lancet Oncology, e a avaliação completa será divulgada pela agência com a atualização da lista nos próximos meses.
Essa análise não é uma demanda nova da IARC, mas tornou-se prioridade máxima da agência desde 2016, quando o primeiro trabalho relacionado ao câncer de fígado foi publicado. Porém, ela destaca que os estudos têm deficiências, e que a inclusão como um item possivelmente cancerígeno é um pedido por mais, e melhores, pesquisas sobre o tema.
“É realmente mais um apelo à comunidade científica para tentar esclarecer e entender melhor o risco carcinogênico, que pode, ou não, ser representado pelo consumo de aspartame. Esperamos que a comunidade comece a analisar esses resultados e a entender se há pesquisas adicionais que possam ser realizadas para ajudar a encontrar as respostas para essas perguntas”, continuou.
Em relação aos mecanismos que podem estar por trás do potencial cancerígeno observado, Federica Madia, toxicologista sênior da IARC, disse que estudos com animais e experimentos em laboratórios sugerem um possível aumento dos níveis de insulina, um estado de inflamação crônica e de estresse oxidativo consequentes do aspartame.
“Ainda assim, alguns dos estudos têm limitações. E certamente os examinaremos com mais detalhes no futuro, esperando que as pesquisas cheguem até elas (as limitações)”, afirmou.
Após essas análises, o aspartame foi incluído no grupo 2B da classificação da IARC, o mais baixo de três que indicam relação com câncer. Nele, por exemplo, há mais de 300 itens, como o extrato de folha inteira de Aloe vera, clorofórmio, gasolina e a exposição ocupacional de trabalhadores de lavagem a seco e de processos de impressão.
No grupo acima, o 2A, estão as substâncias “provavelmente cancerígenas”, ou seja, que contam com mais evidências sobre a chance de gerarem um tumor. Nele, estão a carne vermelha e bebidas muito quentes acima de 65 °C, além de cerca de mais 90 itens. Já no grupo 1, dos que são comprovadamente “cancerígenos”, estão itens como álcool e cigarros, além de outros 120 agentes.
Opções mais saudáveis
O alerta das autoridades de saúde pode levar muitas pessoas a optarem por utilizar outros adoçantes artificiais no dia a dia no lugar do aspartame. Porém, as outras opções não são todas iguais, e há alternativas melhores, diz o cardiologista e nutrólogo Daniel Magnoni, presidente do Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN), em São Paulo.
“Existem diferenças, há adoçantes artificiais produzidos pela indústria química e outros derivados da cana-de-açúcar, que são melhores pois há menos trabalhos científicos mostrando malefícios em relação a eles. Os químicos têm mais estudos relacionando com câncer, por exemplo, como é o caso do aspartame”, diz.
Logo, o ideal é optar pelos de origem natural – o xilitol, o eritritol e a stevia – no lugar de alternativas como aspartame, sacarina, sucralose, ciclamato de sódio e acessulfame de potássio.