Novo Ensino Médio: a escola está preparada para esse novo capítulo da educação?

Uma mudança que vai trazer questões muito importantes para a educação e formação dos jovens

Em fevereiro deste ano começou a ser implementado oficialmente o chamado Novo Ensino Médio, válido para escolas públicas e privadas. A reforma foi aprovada em uma lei de 2017. A principal alteração é a nova organização do currículo, que, além da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), oferece itinerários formativos aos estudantes, escolhidos para complementar a grade curricular. Nesta entrevista, conversamos com o professor Fernando Lorenzon, que também é membro de equipe diretiva da rede estadual de ensino, sobre as adaptações que estão acontecendo nas escolas, desafios e quais são as mudanças que nos aguardam no futuro próximo. Quer entender mais? Confira as respostas do professor.

Jornal Boa Vista: Qual o objetivo desse Novo Ensino Médio?

Fernando Lorenzon: Pelo que lemos nos documentos orientadores e acompanhamos durante as formações e reuniões, existem alguns objetivos que ficam mais explícitos: fazer com que o estudante volte a gostar da escola; reestruturar o ensino médio tendo em vista suprir lacunas de aprendizagem; oferecer opções para os estudantes através dos itinerários formativos (conjuntos de matérias com eixo temático específico ao qual o estudante opta por qual seguir). Claro que esta escolha não é tão livre quanto se divulga, pois há alguns critérios para o itinerário ser ofertado (número de alunos que optaram – pelo menos 25 estudantes).

E as disciplinas, serão por áreas do conhecimento? Quais tiveram redução da carga horária?

As disciplinas têm a sua expressão de resultados individualizada, porém, a construção de conhecimento e andamento durante os bimestres se dá por área de conhecimento (ainda são as mesmas áreas, mais os itinerários formativos e mais as disciplinas de Projeto de Vida, Mundo do Trabalho, Iniciação Científica e, Cultura e Tecnologias Digitais.

Quase todas as matérias tiveram reduções: educação física, história, geografia, filosofia e, como o aumento de carga horária dos itinerários a cada ano é progressivo, a redução de carga horária das outras disciplinas também é. Por exemplo, filosofia, com estas mudanças, passa a existir somente no primeiro ano do ensino médio, o mesmo acontece com a educação física e com a sociologia. História e geografia sofreram reduções de carga horária também.

Por vezes, dependendo do itinerário atribuído à escola, o itinerário supre esta redução, porém, somente em raros casos. No caso da escola em que trabalho, os itinerários atribuídos acabam não suprindo/substituindo a redução de carga horária. Claro que são alterações pontuais perceptíveis até o momento, porém, novas formatações de itinerários estão sendo construídas, o que trará novas alterações até mesmo para as escolas que já vem executando algum itinerário, o que fará com que haja o andamento de diversas matrizes simultaneamente em cada escola.

Os estudantes podem fazer a escolha das disciplinas que irão realizar em cada ano?

Não. Este ano para o Ensino Médio Gaúcho os itinerários já vieram definidos e para o próximo ano ainda estão em discussão de como será a escolha dos componentes para cada escola.

As disciplinas já estão reestruturadas conforme a BNCC?

Com exceção dos itinerários que estão sendo revistos e não há definições claras ainda de como irão funcionar, as disciplinas estão em construção e os novos itinerários estão em fase de desenvolvimento.

Algumas escolas foram selecionadas para serem escolas piloto do Novo Ensino Médio: como foi a experiência? Qual foi o período de duração? Quais os desafios enfrentados? E o que mudou desde então?

Inicialmente, foram ofertados itinerários formativos diversos para as escolas piloto que, através de processo desenvolvido com os estudantes, elencariam dois itinerários para serem ofertados pela instituição. Ao serem definidos os itinerários ofertados em cada uma das escolas piloto, foi feita a construção das ementas destes itinerários em formação em Porto Alegre.

As escolas piloto fariam a implantação em 3 anos, de 2020 a 2022, e após isso, as escolas restantes iriam também aderir e implantar as novas matrizes e orientações. Sinceramente, foi tudo feito bastante as pressas, com prazo apertado para se atender as necessidades da reestruturação com qualidade.

Tendo definidos os dois itinerários da escola (Expressão Corporal e Expressão Cultural), os alunos, através de formulário fizeram suas opções entre um e outro itinerário. No nosso caso, ficou definido o itinerário Expressão Corporal, visto que o outro itinerário não teve número mínimo de 25 alunos optantes.

Ao iniciar a experiência como escola piloto, o primeiro obstáculo foi encontrar professores com perfil e que se dispusessem a assumir as disciplinas do itinerário escolhido. Após a alocação do RH, a dificuldade de se desenvolver o trabalho com as ementas provisórias e o pouco material de estudo disponibilizado aliado à pandemia.

Em 2022 passa a se chamar Ensino Médio Gaúcho e, está sendo construída nova proposta onde serão revistos os itinerários para o próximo ano e foram inseridas as disciplinas de Projeto de Vida (esta foi inserida em toda a educação básica a partir do 6° ano), Mundo do Trabalho, Iniciação Científica, Cultura e Tecnologias Digitais, além dos itinerários.

Além destas alterações, estão sendo desenvolvidas formações periódicas para as disciplinas novas. Fiz a formação para o Mundo do Trabalho e me surpreendi com o desenvolvimento e objetivos da disciplina. Diferente das construções anteriores, além da formação, foi desenvolvida uma ementa bastante completa.

Quais as vantagens e desvantagens desse novo modelo?

Difícil apontar, mas a meu ver a principal vantagem está no fato de se disponibilizar uma nova formatação e a possibilidade, ainda que restrita, de escolha dos estudantes.

O que vejo como principal desvantagem é o fato de que são feitas drásticas reduções de carga horária de várias disciplinas que, até o momento, não são supridas pelos itinerários formativos, fator este que pode afetar os índices de aprovação nos vestibulares.

Quais foram as formações para os professores das disciplinas dos itinerários e demais disciplinas?

Atualmente, somente há formações remotas para as matérias Projeto de Vida, Mundo do Trabalho, Iniciação Científica e Cultura e Tecnologias Digitais. Para os itinerários, não foi feita formação antes e, até o momento, como não temos definições dos novos itinerários ainda não foram fornecidas formações. Isto dificultou muito para encontrar professores que se dispusessem a assumir as matérias dos itinerários.

Como estão as expectativas dos estudantes em relação a esse novo ensino médio?

A maior expectativa que eles tinham era que poderiam escolher que matérias iriam estudar, o que não é verdade, já que se limita a escolha aos itinerários. Ainda há uma parte correspondente à BNCC que é obrigatória. Temos reações diversas em relação a estas mudanças. Alguns preocupados com a diminuição das cargas horárias de algumas matérias, outros recebendo as disciplinas dos itinerários com receio, alguns indiferentes, alguns considerando as matérias dos itinerários desnecessárias outros vendo com bons olhos as mudanças.

Por Aline Koproski