Namoro: prática de amar

Dizem que o casamento por amor é recente. Que os matrimônios, por séculos, foram feitos por interesse, por conveniência, por arranjo. Será que o amor é um luxo moderno, uma invenção romântica que escapa à razão? Se o amor fosse apenas um capricho da modernidade, como explicar sua presença teimosa ao longo da história? Por que ele continua surgindo, mesmo onde não é convidado?

A verdade é que o amor sempre esteve entre nós. E ainda que não fosse a razão principal de muitas uniões no passado, ele surgia com o tempo, com a convivência. Em culturas onde o casamento é decidido pela família, acredita-se que o amor nasce depois. Isso parece absurdo? Só se reduzirmos o amor a um arrebatamento súbito e irracional, uma vertigem romântica. Mas o amor é mais complexo.

Erich Fromm, em “A Arte de Amar”, dizia que não existe amor sem razão. Amar é uma arte. Exige esforço, conhecimento, decisão. A escolha do parceiro pode até ser por decisão alheia ou por impulso. Mas o ato de amar é pessoal e deliberado. Amar se aprende. E se pratica. Todos os dias.

Por que amamos? Porque precisamos. O amor nos tira da solidão, nos lança em direção ao outro. Nele encontramos apoio, partilha, proteção. Amamos porque, sem esse vínculo, não sobreviveríamos – nem como espécie, nem como indivíduos. O amor é uma solução existencial. Ele nos ancora e nos impulsiona.

Fromm chamava esse tipo de amor de “resposta madura ao problema da existência”. É uma união que respeita a individualidade: um casal pode viver separado, mas vive melhor junto. O amor verdadeiro não anula, potencializa. Faz crescer.

Essa capacidade de amar começa cedo. Crianças aprendem a amar sendo amadas. O amor da mãe é incondicional. Ela ama o filho por ser quem ele é. O amor do pai é meritocrático. Ele ama à medida que o filho age corretamente. Ambos moldam nossa consciência: um nos dá segurança, o outro nos prepara para o mundo.

O amor romântico maduro é uma síntese desses dois arquétipos. Amamos alguém por quem ele é e também por como ele age no mundo. É um amor que acolhe e admira. Que cuida e desafia. Que transforma dois estranhos em família. Um tipo de amor que melhora nossas chances de enfrentar o mundo e de criar filhos adaptados a ele.

Ao contrário do amor fraterno ou parental, o amor erótico é exclusivo. Amamos muitos filhos, muitos amigos, mas só nos fundimos profundamente com uma pessoa. Porque esse amor é total. É compromisso em todos os aspectos da vida. É união, mas sem anulação.

Neste Dia dos Namorados, vale lembrar: o amor não é só um sentimento. É um exercício constante. O namoro é um espaço para essa prática. Uma prática que é, ao mesmo tempo, treino e ação. No namoro decidimos, dia após dia, amar alguém por inteiro. Assim o amor se fortalece. E nos fortalece também.

 

POR:  Marcia Esteves Agostinho é doutora em História, especialista em emoções coletivas e autora de “Por que casamos?

(Imagem: Divulgação Freepik)