Erechim, como toda a cidade, é um sistema vivo. Isso significa que temos que pensar o espaço urbano sempre para as pessoas. Cidades são organizadas para pessoas. Fora isso, o que temos são espaços que desumanizam, que não reconhecem direitos e, sobretudo, que imobilizam, tanto no sentido da mobilidade, como no sentido dos sonhos.
Uma cidade tem alma, tem algo que nos prende e que, na mesma medida, pode nos afastar. Quando dizemos “minha cidade”, estamos nos referindo a um espaço íntimo, próximo, um pouco nosso nessa comunhão com as demais pessoas que o habitam. Coabitar é habitar juntos(as), é conviver, é compartilhar. A cidade, assim, tem de ser coletiva, não de alguns e algumas. O espaço da cidade é uma teia, tem vários fios que formam o tecido urbano, muitas vezes, emaranhado, outra vezes, sem nós.
Mas uma cidade “sem nós” é um espaço vazio, é um não–lugar, é apenas natureza em estado puro. O meio ambiente é essa soma de natureza com gente, de forma a ser uma única só coisa. Assim, a cidade é cultura, é experiência, é aprender e ensinar, é alegria e tristeza, é inverno e verão. Em sentido amplo, a cidade é também campo, é inclusiva, solidária, é, sobretudo, daqueles e daquelas que lá vivem: é o espaço da cidadania, dos cidadãos e das cidadãs.
Contudo, a cidade real é um lugar que pode ser vários lugares, sentida de diferentes formas. Pense na nossa cidade de Erechim, a capital da amizade que, podemos perguntar, é de quais amigos(as)? Como vivemos e com quem vivemos a cidade? Como nos movemos nela?
Se cada pessoa tiver um carro, e já temos quase 90 mil, o trânsito para. Se ele para, a cidade deixa de ser para as pessoas, e vira para os carros. Uma cidade que só transporta as pessoas de carro é um cidade individualista, construída por asfalto. Mas, então, e o nosso transporte coletivo? Aí temos um pouco da nossa (i)mobilidade. Não é fácil depender de ônibus em Erechim. A concessão pública não concede um serviço (bem) pago de qualidade. Quem usa o ônibus sabe disso porque sente, não apenas pensa nisso lendo, por exemplo, este texto.
As pessoas que têm carros, algumas até alguns, talvez não se importem com o preço da passagem, com os horários disponíveis, com os trajetos e com os pontos ou paradas de ônibus da cidade. Não se importar com isso ao andar de carro importado é um sinal de que algumas pessoas da cidade não reconhecem as outras pessoas. O trânsito é, sobretudo, um assunto de pedestres que somos. É também assunto de quem pode usar a bicicleta, sem ciclovia, disputando espaço com carros que precisam ir e vir.
O trânsito é educativo, pois é coletivo. Todo mundo que vive na cidade se importa com o ir e vir. Imagine uma pessoa cadeirante andar pela nossa cidade. Se você não é, faça um exercício de se colocar um pouco no lugar da outra pessoa. Como é ir de cadeiras de todas da Praça Jayme Lago até a Praça da Bandeira? Como é andar de cadeira de rodas pelos bairros da cidade? Como é ser cadeirante e precisar de ônibus?
A Erechim das pessoas é a cidade do movimento, do acesso, do cuidado e que abraça a todo mundo que nela vive ou vem visitar. A capital da amizade não poderia escolher poucos(as) amigos(as), certo?
Entre aspas
O debate sobre a vida na cidade é muito importante, pois é onde as coisas acontecem. Nesse sentido, a UFFS passou a integrar neste mês de agosto a Cátedra Unesco UniTwin “A Cidade que Educa e Transforma”, liderada pelo Instituto Superior de Educação e Ciências (ISEC) Lisboa. Vale destacar que a URI já faz parte desta rede internacional.
A partir da ideia das cidades educadoras, a Cátedra vai promover a articulação de universidades e o desenvolvimento de ações que aprofundem os projetos já em andamento, buscando cidades sustentáveis, culturalmente pulsantes e pautadas no bem viver.
Thiago Ingrassia Pereira
Professor da UFFS Erechim
Coordenador do Projeto de Extensão “Dizer a sua palavra”: democratização da cultura popular e da comunicação