I – A ONU divulgou em 2017 um relatório com o ranking dos países segundo a felicidade da população. Para efeito de composição de um índice de felicidade foi considerado o PIB per capita e a expectativa de vida da população, bem como a percepção dos cidadãos de 155 países sobre apoio social da comunidade, confiança nas instituições, liberdade para tomar decisões e generosidade. Nas cinco primeiras posições encontram-se Noruega, Dinamarca, Islândia, Suíça e Finlândia, todos esses países europeus e quatro dos quais situados no norte desse mesmo continente. Tais países possuem singularidades culturais e formações históricas particulares, mas há também aquilo que os une: todos possuem uma economia complexa e dinâmica que se combina com elevada proteção social.
II – Segundo o próprio relatório das Nações Unidas, “os países mais felizes são aqueles em que há um equilibro saudável na prosperidade e um alto capital social, o que leva a uma confiança na sociedade, baixos níveis de desigualdade e confiança no governo”. Isso significa que não basta produzir riqueza para construir uma nação feliz. Mais que isso, é fundamental que essa riqueza seja distribuída da forma mais justa possível e que um sentimento de solidariedade e confiança esteja presente nas relações interinstitucionais e interpessoais. Parece relativamente simples chegar ao patamar atingido pelos países nórdicos, mas se trata de uma equação complexa, que se resolve ao longo do tempo, mediante o empenho do Estado, do mercado e da sociedade civil. Torna-se imperativo uma economia dinâmica, com nível elevado de investimento em ciência e inovação, aliado a um sentido de justiça que reforce a equidade social.
III – Mas e a posição do Brasil nesse ranking? Pois bem, nosso país ocupa o 22º lugar, uma posição relativamente bem situada, apesar de todas as mazelas sociais que nos tornaram um dos países mais desiguais e injustos do mundo. É verdade que esse se trata de um ranking geral, que considera o país como um todo. Entretanto, imagine um índice dessa natureza que tratasse de medir o índice de felicidade comparando regiões do país, dos Estados ou mesmo os bairros e as regiões de uma mesma cidade. Não é possível imaginar que os moradores de uma comunidade de periferia, feita refém pelo tráfico, ou mesmo ocupada pelo exército (como é o caso do Rio de Janeiro na atualidade), sejam tão felizes quanto aqueles que habitam condomínios de luxo nas regiões nobres da cidade. Há diferenças profundas na renda, na expectativa de vida e na forma como esses cidadãos acessam os serviços públicos. Do mesmo modo, as percepções sobre a felicidade também são condicionadas pela posição que os indivíduos ocupam na estrutura social.
IV – Nós, como nação, ainda procuramos por um caminho para a felicidade socialmente partilhada (mesmo que alguns sequer considerem que a felicidade deva ser um bem socialmente partilhado). Enquanto isso, nós continuamos apostando em soluções individuais e pensando o mundo ao redor do nosso umbigo, como se tudo que está distante de nós não nos afetasse. Isso se manifesta na forma como compreendemos as políticas sociais, no modo como tratamos o meio ambiente e no valor que atribuímos à vida. Nossas necessidades pessoais e imediatas estão sempre em posição privilegiada, em detrimento dos interesses coletivos. O primeiro movimento para nos tornarmos um país mais feliz deve residir na busca por um maior equilíbrio entre o indivíduo e a sociedade. Precisamos de uma sociedade justa que não sufoque o indivíduo, e de um indivíduo livre que não pense o mundo exclusivamente a partir de si.
Outras palavras:
- Escrevo minha coluna desse mês em deslocamento de trem de Lisboa para Coimbra. Como todos sabem, o trem é um meio de transporte econômico, seguro, confortável e sustentável. Faz tempo que Portugal entendeu isso. Por outro lado, o Brasil preferiu investir em carros, ônibus e estradas, assumindo com isso todas as consequências dessa escolha. Fica a pergunta: quantas vidas seriam poupadas anualmente se tivéssemos um sistema de transportes por trens no país?
- Há uma tranqüilidade em Portugal que não se encontra no Brasil, mesmo em cidades menores do interior. A isso se soma a generosidade das pessoas. Quando cheguei a Lisboa, no metro, um senhor que aparentar aproximadamente 80 anos quis me ajudar com as malas. Agradeci, porque não estavam tão pesadas, e o senhor parecia frágil, mas entendi esse gesto como uma recepção de boas vindas. E que bela recepção.
- “A língua que menos se ouve em Lisboa é o português”. Entenda isso como um exagero, mas que se aproxima bastante da realidade. Percebi uma grande diferença comparativamente à primeira vez que estive aqui, no ano de 2014. Há muito mais estrangeiros na cidade, alguns vieram para morar, outros estão a passeio, e isso fez com que Lisboa se tornasse uma grande torre de babel.
Por Luís Fernando Santos Corrêa da Silva
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