E se faltarem professores(as)?

Thiago Ingrassia Pereira
UFFS

 

I
Imaginem uma pesquisa com diversas pessoas em uma tarde movimentada no centro de Erechim. Quem está pesquisando se aproxima, com seu crachá e prancheta tradicional, e pergunta: “O senhor(a) acredita que uma boa educação é importante para o desenvolvimento do país?”. Minha hipótese é que boa parte dos(as) entrevistados(as) dirá sem pensar muito: “sim!”. Continuando a pesquisa, imagino que a resposta “sim!” aparecerá com ênfase nas respostas às seguintes perguntas: “O senhor(a) acha importante que seu filho ou filha tenha aula com bons/boas professores(as)?”, O senhor(a) defende que uma boa escola é fundamental à preparação da vida universitária?”, O senhor(a) acredita na importância da ciência, tecnologia e inovação para o crescimento do Brasil?”.

II
Muitas outras perguntas sobre a importância de uma boa escola, de uma boa universidade, da formação cultural e profissional de qualidade, enfim, seriam respondidas por parte dos(as) entrevistados(as) de forma positiva. Esse reconhecimento médio é o que sustenta um discurso permanente de valorização da educação e da escola. Contudo, paradoxalmente, os(as) profissionais da educação seguem sendo desvalorizados e os investimentos públicos na área seguem muito abaixo do necessário. Por quê?

III
Há um apoio difuso em nível simbólico à educação e aos(às) professores(as) que convive com a ausência de um apoio específico a pautas objetivas de valorização desta área. Nossa sociedade convive bem com a ideia de que a docência é uma “vocação” e o salário apenas uma consequência. Ouço que a opção pela docência deveria vir acompanhada de uma naturalização do quadro atual, ou seja, não me venham fazer greve porque já sabiam o que iam ganhar! Esta posição cínica é fruto de uma ingenuidade ou desconhecimento de algumas pessoas que, também exploradas e com baixas perspectivas de melhora, fazem eco a discursos simplificadores da realidade. Não, a carreira de professor(a) em nosso país não está nesse cenário de crise permanente porque “Deus quis” ou porque “as coisas são assim, fazer o quê?”. A explicação é de natureza política.

IV
Poucos(as) jovens querem ser professores(as) na atualidade. Pesquisa nacional realizada pela Fundação Carlos Chagas há alguns anos (2011) mostrou que apenas 2% dos(as) concluintes do ensino médio tinham um curso de Licenciatura como primeira opção na universidade. E esse cenário tende a piorar, pois a atratividade da carreira não anda lá essas coisas. Passa pelo salário, mas, sobretudo, pelo reconhecimento social que, insisto, convive com esse paradoxo de um discurso vago de valorização e uma prática cotidiana de desrespeito a quem ensina.

V
Aliás, só ensina quem aprende. Os cursos de Licenciatura, que formam professores(as) em nível superior, apresentam baixa procura relativa e alta evasão. O resultado é que um número reduzido de estudantes se forma para lecionar e o pior: entre os(as) que se habilitam à docência, muitos(as) exercem outras atividades, talvez mais rentáveis, talvez menos desgastantes, talvez como menos discursos de apoio, mas… ninguém paga as contas com tapinhas nas costas!

VI
Dados do Censo Escolar 2016 indicam que 2,2 milhões de professores(as) atuam na educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio). Destes, mais de 77% possuem curso superior, sendo que entre estes/estas mais de 90% cursaram uma Licenciatura. Mesmo constituindo um segmento profissional com alta escolaridade, pesquisa do Inep (201) mostra que os(as) professores(as) recebem em média entre 18% e 39% a menos em comparação com profissionais de outras áreas e com o mesmo grau de formação. Dessa forma, cerca de 99% dos(as) professores(as) brasileiros(as) ganham em média até R$3,5 mil mensais para 40h por semana.

VII
Um atenuante neste cenário adverso à docência é a criação e correção anual do piso nacional do magistério. Trata-se de política importante, ainda que muito longe do necessário. Instituído em 2009, equivalia a R$ 950,00 para profissional formado(a) com curso médio e 40h semanais. Atualmente (2017), o valor do piso está em R$ 2.298,80. O detalhe é que 14 estados não cumprem o piso, incluindo o Rio Grande do Sul que, na administração Sartori (PMDB) ainda humilha servidores de carreira com parcelamentos e atrasos. Em Erechim, os(as) professores(as) municipais recebem o piso e tiveram avanços (tímidos) em seu plano de carreira nos últimos anos. Na rede privada, o pagamento é feito por horas-aula e outras vantagens previstas na legislação.

VIII
A questão que se coloca é: e se faltarem professores(as)? Neste cenário brevemente refletido aqui, é possível vermos que não estamos longe dessa possibilidade. O que fazer? Sair do discurso para a prática! Valorizar de fato a carreira docente, com salário e condições de trabalho. Avançar em relação ao paradoxo atual é essencial para que nosso sistema não entre em colapso definitivo. Há quem sustente que, ao chegarmos no “fundo do poço” as coisas, necessariamente, melhorariam. Não sei não. É melhor não chegar lá (mesmo que em tempo de PECs contra o investimento público…). Temos o diagnóstico, precisamos de ações efetivas. Ano que vem, antes de votar, se informe do programa (quais as propostas) de quem irá votar. Chega de apoiarmos a educação e não incentivarmos nossos filhos e filhas a serem professores(as). A corda vem estourando… e todos e todas iremos cair!