É falso que os Andes protegem o Brasil de furacões

Publicações nas redes sociais viralizaram nos últimos dias com a afirmação grotesca do ponto de vista científico que os Andes protegem o Brasil de furacões

Várias contas em redes sociais disseminaram nos últimos dias, a partir do noticiário do furacão Milton nos Estados Unidos, a informação falsa de que o Brasil estaria protegido do risco de furacões devido à cadeia montanhosa da Cordilheira dos Andes. Somente uma postagem na rede social X, antigo Twitter, teve 33 mil compartilhamentos e 224 mil curtidas com 9 milhões de visualizações.

 

A afirmação viralizada nas redes sociais de que a Cordilheira dos Andes protege o Brasil de ser atingido por furacões é absolutamente falsa e errada, além de ser grotesca do ponto de vista científico e geográfico.

 

De início, o Brasil já teve furacão. No final de março de 2004, um furacão se formou no Atlântico Sul e se deslocou de Leste para o Oeste, atingindo o Nordeste do Rio Grande do Sul e o Sul de Santa Catarina. A tempestade batizada de Catarina deixou saldo de mais de 10 mortos e prejuízo estimado à época superior a um bilhão de reais.

 

Nos últimos 20 anos, vários ciclones tropicais se formaram na costa brasileira sob águas mais quentes, atingindo até o status de tempestade tropical (vento entre 60 km/h e 120 km/h em ciclone tropical) que precede o de furacão (vento acima de 120 km/h). Foram os casos das tempestades Anita (2010), Iba (2019), 01Q (não nomeada pela Marinha do Brasil) em 2021 e Akará (2024).

 

Todos estes sistemas se formaram na costa brasileira, ou seja, no Oceano Atlântico. Os furacões no litoral do Brasil apenas não são mais frequentes porque, diferentemente do Atlântico Norte, as águas aquecem menos e há uma maior divergência de vento (que sopra de direções diferentes).

 

Esse último elemento é o principal que desfavorece os ciclones tropicais de ganharem maior intensidade na costa brasileira quando se formam, não se transformando em furacões e permanecendo como tempestades tropicais. Em 2004, sob condições que foram excepcionais, o ciclone Catarina encontrou um ambiente favorável que garantiu que se intensificasse até se transformar em um furacão no limite das categorias 1 e 2 da escala Saffir-Simpson.

 

Cientistas acreditam que as mudanças climáticas induzidas pelo homem com um maior aquecimento do oceanos podem fazer com que aumente a frequência de ciclones de natureza tropical nas próximas décadas, assim agravando o risco de formação de furacões.

 

No outro lado da América do Sul, na costa Oeste, onde o oceano não é o Atlântico e sim o Pacífico, a realidade é muito diferente. As águas são frias a muito frias devido à Corrente de Humboldt, também chamada de Corrente do Peru.

 

A corrente marítima se estende por milhares de quilômetros do Sul do Chile (45º de latitude Sul) ao Norte do Peru (5ºS). Embora o Peru esteja situado na região tropical, a temperatura do mar é muito baixa para uma região nos trópicos. Isso favorece que a cidade de Lima conviva frequentemente com abundante nebulosidade e temperatura mais amena com pouca chuva e escassas tempestades de raios.

 

Com as águas muitos frias da Corrente de Humboldt, as condições são desfavoráveis à formação de ciclones tropicais na costa Oeste da América do Sul. Assim, se furacões não se formam no Pacífico junto à América do Sul, obviamente a Cordilheira dos Andes não protege o Brasil de furacões porque simplesmente eles não se formam no outro lado da cadeia montanhosa.

 

Mapa de ciclones tropicais no mundo entre 1986 e 2005 | NASA

 

Onde os furacões se formam no Pacifico junto ao continente americano é na costa da América Central e principalmente do México, onde as águas são quentes. Há casos até de ciclones tropicais que se formaram no Pacífico e cruzaram o continente, alcançando o Atlântico e vice-versa. São chamados de Atlantic-Pacific Crossover Hurricane.

 

No ano 2000, foi decidido que os ciclones tropicais que se movem do Atlântico para a bacia do Pacífico Oriental e vice-versa não seriam mais renomeados. Isso porque as listas de nomes para batizar as tempestades das duas bacias (Atlântico Norte e Pacífico Leste) são diferentes. O furacão Otto em 2016 foi a primeira tempestade a cruzar de uma bacia para outra que manteve o nome.

 

Por Metsul. https://metsul.com/verificamos-e-falso-que-os-andes-protegem-o-brasil-de-furacoes/ .