Em declaração final da cúpula do Brics no Rio de Janeiro, líderes de 11 países fizeram nesse domingo (6) uma firme defesa do multilateralismo, no momento em que instituições como a Organização das Nações Unidas (ONU) estão sob intensa pressão. O texto inclui condenações a guerras e a sanções econômicas como ferramentas políticas, mas sem mencionar o “tarifaço” de Trump.
Os países expressam “preocupação com os conflitos em curso em diversas partes do mundo e com o atual estado de polarização e fragmentação da ordem internacional” e defendem uma “abordagem multilateral que respeite as diversas perspectivas e posições nacionais sobre questões globais cruciais”. Na reunião do Rio estavam ausentes os presidentes da China, Xi Jinping, e da Rússia, Vladimir Putin, que participou por videoconferência.
“Conclamamos a comunidade internacional a responder a esses desafios e às ameaças à segurança associadas por meio de medidas político-diplomáticas para reduzir o potencial de conflitos e enfatizamos a necessidade de engajamento em esforços de prevenção de conflitos, inclusive por meio do enfrentamento de suas causas profundas”, diz o texto.
Há uma menção ao aumento dos gastos militares, referência indireta ao recente anúncio da Otan, a principal aliança militar do Ocidente, que elevou o patamar desejado de gastos com Defesa no bloco para 5% do PIB, também citada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu discurso na manhã de domingo. Em um dos pontos de atrito dentro do bloco, a reforma do Conselho de Segurança, a declaração destaca a necessidade de uma reforma que inclua países em desenvolvimento, mas reconhecendo as “aspirações legítimas dos países africanos”.
Dentro do Brics, Brasil e Índia são as principais vozes em defesa da expansão do Conselho de Segurança. Por outro lado, a África do Sul aponta seu compromisso junto aos demais países africanos, através do Consenso de Ezulwini, de 2005, que estabeleceu que o continente deve ter ao menos dois assentos permanentes e cinco não permanentes no Conselho, definidos no âmbito da União Africana. A saída no comunicado foi adotar uma linguagem mais branda, sem compromissos abrangentes.
O comunicado condena os ataques de Israel ao Irã, em junho passado, que deram início a um conflito aéreo entre os dois países que durou quase duas semanas, reiterando a preocupação com as ações contra “instalações nucleares pacíficas”, mas sem mencionar o governo israelense, Teerã queria termos mais duros, mas essa foi uma demanda contornada pelos negociadores — ou os EUA, que bombardearam instalações nucleares iranianas.
“Neste contexto, reiteramos nosso apoio às iniciativas diplomáticas destinadas a enfrentar os desafios regionais. Exortamos o Conselho de Segurança das Nações Unidas a se ocupar desta questão”, diz o texto.
Ao falar sobre outra crise, que permeia a História recente do Oriente Médio, as nações do bloco expressam “profunda preocupação” com a retomada dos ataques israelenses na Faixa de Gaza, citando Israel e condenando “ todas as violações do DIH (Direito Internacional Humanitário), inclusive o uso da fome como método de guerra”.
“Exortamos as partes a se engajarem, de boa-fé, em novas negociações com vistas à obtenção de um cessar-fogo imediato, permanente e incondicional; à retirada completa das forças israelenses da Faixa de Gaza e de todas as demais partes do Território Palestino Ocupado; à libertação de todos os reféns e detidos em violação ao direito internacional; e ao acesso e entrega sustentados e desimpedidos da ajuda humanitária”, afirma o texto.
Na parte dedicada à economia, o comunicado cita o Novo Banco de Desenvolvimento, chamado informalmente de “Banco do Brics”, “como um agente robusto e estratégico de desenvolvimento e modernização no Sul Global” e destaca as discussões sobre um novo sistema de pagamentos internacional. Mas, como esperado, o texto não apresenta espaço para a criação de uma moeda única do Brics, tampouco passos concretos para o abandono do dólar no comércio internacional. Em janeiro, o presidente dos EUA, Donald Trump, disse que aplicaria tarifas de 100% sobre os países do bloco caso avançassem com a ideia.
Por sinal, havia expectativa sobre a posição em relação à guerra tarifária dos EUA, assim como a imposição de sanções contra membros do Brics — Rússia e China. A declaração, embora condene a “imposição de medidas coercitivas unilaterais contrárias ao direito internacional” e cite suas “implicações negativas”, não aponta para a Casa Branca e seu tarifaço, no momento em que a maior parte dos países tenta negociar novos termos com Washington ou ao menos adiar ao máximo as medidas contra suas importações. Sobre a política de sanções, o texto diz que os membros do grupo “não impõem nem apoiam sanções não autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU”.
(Com informações do jornal O Globo)