O PT gaúcho vai defender, nas discussões que vão acontecer nos próximos meses sobre os rumos do partido, e que visam as eleições de 2026, que a legenda se mantenha à esquerda no espectro político, sem deslocamento para o centro.
O debate interno sobre um reposicionamento será oficializado no calendário a partir de dezembro, e se estabeleceu após os resultados das eleições municipais deste ano. Nelas, o PSD e o MDB obtiveram os melhores desempenhos. Ambas as siglas são consideradas como de centro. Integram a base do presidente Lula. E têm parte de suas lideranças identificadas com a direita.
A prioridade do partido no Brasil para 2026 é reeleger Lula, obtendo apoios de parte dos que, em 2022, na definição de lideranças petistas gaúchas, “estavam do outro lado”. Já fazem parte das articulações para alcançar a meta as negociações sobre os novos comandos do Senado e da Câmara dos Deputados, e uma reforma ministerial, que poderá ser fatiada.
O PT vai apoiar Davi Alcolumbre (União Brasil/AP) para a presidência do Senado e Hugo Motta (Republicanos/PB) para a presidência da Câmara. As trocas nos comandos das duas Casas ocorrerão no início de 2025. Mas a sigla precisa se fortalecer nos estados, e os resultados que saíram das urnas no pleito municipal acenderam um alerta.
Na prática, da condução da economia às diretrizes para a infraestrutura, passando por políticas para áreas básicas, como saúde e educação, a atuação da atual administração petista é de fato centrista, mesmo que lideranças do RS refutem a identificação. Apesar disso, no imaginário de uma grande parcela da população, e nos embates com adversários, segue existindo, e ganhando espaço, a versão de que o governo seria ‘esquerdista’.
Entre gaúchos, a preocupação é de que o ajuste no discurso possa passar a mensagem de abandono de bandeiras históricas e, de quebra, afastar aliados importantes: leia-se PSol.
“É absurdo acreditar que devemos fazer um movimento para o centro porque não crescemos (na eleição deste ano) como os partidos tradicionais crescem quando estão dentro do aparelho. Se o PT fizesse o movimento de abandonar as bandeiras do desenvolvimento e da esquerda, estaria sendo hegemonizado pelos setores centristas e de direita. Um partido tem sempre que se atualizar, mas mantendo seus princípios”, argumenta a deputada federal Maria do Rosário.
Recentemente derrotada pelo emedebista Sebastião Melo, que formou uma aliança de centro-direita fortemente identificada com o bolsonarismo, na disputa pela prefeitura de Porto Alegre, a parlamentar integra a executiva nacional do PT e a atual Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Sua tese, de manter a legenda na esquerda, é disseminada entre diferentes grupos do diretório gaúcho.
Comunga da avaliação de Rosário, por exemplo, o líder da bancada da agremiação na Assembleia Legislativa, deputado Miguel Rossetto, que pertence à ala distinta da parlamentar. “O PT é um partido de esquerda e vai continuar assim. A população mais do que nunca precisa de um partido de esquerda forte, com agenda clara sobre desenvolvimento, saúde, educação, trabalho e meio ambiente. E que faça uma reforma tributária que enfrente a concentração de renda”, garante.
No comando partidário, o entendimento é o mesmo. Segundo a presidente estadual, Juçara Dutra Vieira, a sigla precisa encontrar caminhos para ampliar o “diálogo social”, mas se apresentando à sociedade como uma alternativa de esquerda, e não de centro.
“Uma coisa são as alianças táticas. E outra é a necessidade que temos de atualizar nossa atuação, o que vamos fazer sem abrir mão do que somos.”
ESTRATÉGIA VAI ‘SOLDAR’ ESQUERDA E CENTRO
A estratégia que pretende, ao mesmo tempo, seguir identificando o PT como um partido de esquerda e fortalecer Lula como um líder de centro já começou a ser testada em manifestações públicas de ministros e lideranças partidárias (da legenda ou aliadas). Mas ainda está sendo afinada, e ganhará corpo mesmo em 2025. Antes, vai permear a reunião do diretório nacional em 7 de dezembro, e as dos estaduais, na sequência. A do diretório gaúcho será em 14 de dezembro.
Na semana passada, na primeira reunião da executiva estadual após as eleições, foi constituído um grupo de trabalho que elabora agora um balanço do que aconteceu no pleito municipal no Estado. Ele também vai apontar diretrizes e um calendário. Na metade de 2025 a sigla elegerá novas direções, em todos os níveis.
Nacionalmente, o grupo eleitoral começa a discutir nesta semana os primeiros movimentos das candidaturas aos governos estaduais e ao Senado em 2026.
“É inédito que, no ano da eleição municipal, ao mesmo tempo em que ocorrem análise e avaliação, tenhamos uma reunião do grupo de trabalho eleitoral para o primeiro desenho de como pretendemos nos apresentar para o Senado federal e os governos estaduais. Significa que estamos muito em alerta. Tem a ver com os resultados eleitorais de 2024, com o cenário internacional e com os desafios colocados em nosso projeto maior, que é a reeleição do presidente Lula”, confirma Rosário.
Por: Flavia Bemfica Correio do Povo