Alto Uruguai clama por ração, abate de animais e processamento do leite

A manhã de segunda-feira (28) foi marcada por reunião na Associação dos Municípios do Alto Uruguai (AMAU) em Erechim. Prefeitos, secretários e demais líderes dos municípios da região, bem como, representantes de cooperativas Aurora, Copérdia e Cooperalfa, dialogaram com relação à greve dos caminhoneiros. Por conta da paralisação muitos serviços têm sido afetados, principalmente os produtores de leite, aves e suínos. Em meio a tanta informação o cenário assusta e nesta sexta-feira, o Jornal Boa Vista relata os depoimentos das cooperativas, prefeitos e demais envolvidos, bem como, fala sobre, a quantidade de animais que hoje estão no campo e o quanto consomem. Vale lembrar que após a reunião, que durou mais de duas horas, os prefeitos optaram por decretar situação de calamidade pública e os 32 municípios estão fazendo seu decreto individual. O momento não é para discutir quem é a favor ou contra a manifestação, até porque as informações têm mudado a todo instante, mas as dificuldades que pairam no interior são inúmeras.

Confira os dados apresentados durante a reunião da AMAU:

Copérdia: Sem ração e espaço para abrigar os animais

O médico Veterinário e supervisor de Suinocultura da Copérdia, Jean Tedesco, comentou que hoje o Rio Grande do Sul conta com cerca de oito mil matrizes suínas, 20 mil leitões em creche e mais de 95 produtores de compra e terminação, isso representa cerca de 160 produtores só de suinocultura. Ainda na terça-feira (22), a Copérdia havia informado aos produtores que era preciso realizar a redução de ração. “A preocupação é eminente e os próximos dias serão de caos, produtores ficarão sem ração e espaço para abrigar os animais”, disse Tedesco.

Cooperalfa: 300 a 400 mil litros de leite jogados fora

Para, Eudes Biavatti, gerente comercial da Alfa em Erechim, uma das alternativas é mostrar nos locais de barreira a situação dos agricultores, tentar sensibilizar. “O leite por parte da Alfa já foi de 300 a 400 mil litros jogados fora. O leite é mais difícil, pois as indústrias ficam longe. Como os desvios são inúmeros, estamos andando o triplo de tempo, pelas estradas de roça, quebrando caminhão e ficando sem combustível”, relatou.

“Vai faltar comida para as pessoas”

O supervisor de filias da Cooperalfa, Jorge Brock, diz que “falamos bastante de aves e suínos porque hoje estão correndo risco de canibalismo e morte por falta de alimento. O leite os produtores estão arcando com o preço, perdendo recurso, mas a vaca não vai deixar de produzir. No entanto, em longo prazo o produtor começa se descapitalizar. Hoje não tem mais como recolher o leite, pois chega ao ponto de resfriamento, mas não consegue ser processado e o mesmo, não pode posar na unidade de resfriamento”, explicou Brock. Disse ainda que precisamos de mobilização para que a greve termine e se consiga um entendimento. “Não é momento de ser contrário ou a favor, mas a situação precisa ser resolvida, pois quem vai pagar a conta novamente é o pequeno produtor. Se continuar por mais uma semana vai faltar comida para as pessoas”, finalizou.

Aurora produz mais de mil toneladas de ração dia

A Aurora atende todos os suinocultores e avicultores integrados da cooperativa na região do Alto Uruguai e Sarandi, produz mais de mil toneladas de ração por dia para suínos e aves e, entrega cerca de 80 cargas diariamente, usando 15 caminhões. Segundo o supervisor da fábrica de rações da Aurora, Cristiano Parzianello, está difícil chegar até os produtores, sem contar que nenhum frigorífico da Aurora está abatendo, então além dos animais que ficam frequentemente no campo, tem aqueles que não estão sendo abatidos. “Acaba sendo uma bola de neve, uma entrega normal é de 50 km, hoje os transportadores estão tendo que fazer 80 a 100 km. Quando o caminhão está chegando à propriedade a alegria do produtor não tem explicação. Entretanto a matéria prima está acabando, estamos enviando milho moído para manter os animais vivos. Precisamos encarecidamente de acesso livre às propriedades. Com o passar dos dias a necessidade será maior, a cada minuto que passa, um produtor liga dizendo que a ração está terminando”, relatou Parzianello.165 mil cabeças de suínos sendo engordadas

Hoje só a Alfa, em sistema de engorda, tem mais de 165 mil cabeças de suínos sendo engordadas, em fase de creche, são mais 38 mil leitões alojados da Alfa, fora a Copérdia e mais de 18 mil matrizes produzindo leitões. “Hoje a ração é praticamente milho moído e a grande maioria não tem nem milho na propriedade, só estocado nas cooperativas. Estamos falando em escala de produção e por isso o grande problema. Esta semana a gente precisa recolher os leitões, a produção na granja é contínua, o produtor não tem espaço para deixar os leitões na propriedade. Falando em abate, 15 mil cabeças estão represadas no campo da Aurora no Rio Grande do Sul, isso representa mais de dois milhões e 100 mil quilos de carne estocados e represados no campo. A problemática bate na porta das cooperativas, mas principalmente do produtor rural, eles estão desesperados, não sabem o que fazer”, afirmou o supervisor de Suinocultura da Aurora no Rio Grande do Sul, Fabricio Haubert.

Também comentou que carga viva os manifestantes estão deixando passar, mas a dificuldade é o caminhoneiro chegar até o destino, retornar e ainda garantir combustível. Muitos motoristas estão com medo de sair da fábrica de rações, por receio de represálias. Campinas do Sul, Barão de Cotegipe e Aratiba, estão entre os pontos com maior dificuldade de negociação.

3,5 milhões de aves e 280 produtores

Hoje a Aurora tem represado em campo 3,5 milhões de aves – de um dia até 44 dias, são cerca de 280 produtores entre Alfa e Copérdia. Até agora (segunda-feira) nenhum animal está sem alimento, a fábrica está dando um jeito de realizar as entregas por meio dos desvios. “Estamos realizando a restrição alimentar destas aves e não sabemos quando vai voltar à normalidade, precisamos economizar ração, para tentar estender ao máximo o abate. Um aviário de 100 metros come 2.500 quilos de ração dia, não é um caminhão que vai fazer a diferença, precisa bastante quantidade. As aves que eram para ser abatidas quinta e sexta-feira da semana passada ficaram, as que eram para ser abatidas nesta segunda e terça-feira, ficaram também, a quantidade só aumenta e precisamos manter o bem estar destes animais”, assegurou o delegado de Avicultura no Rio Grande do Sul, Ricardo.

“O movimento é todo fragmentado e para os municípios acaba sendo difícil conversar com os representantes”

Para os prefeitos do Alto Uruguai a dificuldade, principalmente nos pontos de barreira, está em identificar as lideranças. “O movimento é todo fragmentado e para os municípios acaba sendo difícil conversar com os representantes. Não sabemos o que vai acontecer amanhã e o movimento parece que vem se consolidando. O Estado do Rio Grande do Sul criou um comitê de crise e através deles estamos tentando liberar o combustível para Getúlio Vargas para atender saúde, educação e prioridades. Sugiro que as cooperativas e municípios façam o mesmo. Por mais que tentamos encontrar uma solução não temos a quem nos direcionar, acho que uma das melhores alternativas é o comitê de crise, para que através da Brigada Militar, os caminhões possam ser escoltados”, disse o prefeito de Getúlio Vargas, Maurício Soligo.

“Falta de interlocutores e governo não levou a sério as reivindicações”

O prefeito de Erechim, Luiz Francisco Schmidt, fala que indiscutivelmente o movimento iniciou de forma justa. “Ninguém contesta a legitimidade do movimento quando surgiu reivindicatório a política de fretes e combustíveis. Mas na medida em que foi avançando aconteceram dois problemas, a falta de interlocutores por parte do próprio movimento e segundo, o governo também não levou a sério as reivindicações. Com apoio da população e nosso também, levamos até comida, o movimento começou justo. Hoje, quando penalizamos quem não tem nada haver com a política de fretes e combustíveis, produtores rurais, estamos penalizando a nossa própria comunidade”, finalizou.

Por Carla Emanuele 

 

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