Pelo terceiro ano consecutivo, o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) trouxe para a 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29), em Baku, no Azerbaijão, a Casa da Agricultura Sustentável. É um espaço de debates sobre como o setor pode se transformar para enfrentar as mudanças climáticas.
O desafio vai muito além de novas práticas para a produção, afirma o diretor-presidente do IICA, Manuel Otero (foto). Para ele, é necessário também mostrar para o mundo que o setor é capaz de se comprometer com a sustentabilidade do planeta.
“Para isso trabalhamos em diferentes dimensões. Uma delas está numa nova geração de políticas públicas que reconheçam os novos limites da agricultura como um setor que tem que ser ambientalmente responsável, nutricionalmente inteligente, que acompanhe o que ocorre no comércio internacional, mas também socialmente responsável. Além disso, estamos construindo uma nova narrativa”, disse.
Nessa direção, o IICA trouxe para o Azerbaijão visões e modelos de sucesso que ocorrem nos 34 países das Américas que integram a instituição. Ao longo dos 12 dias de conferência, o espaço receberá mais de 50 painéis e diálogos envolvendo a participação de centenas de produtores, acadêmicos e representantes de instituições governamentais e da sociedade civil.
Modelos
Entre eles, o ministro do Desenvolvimento Agrário do Brasil, Paulo Teixeira, que participou do painel Ação Climática: vozes dos produtores na luta contra a mudança climática.
Na apresentação, o ministro fez um balanço dos últimos quatro meses do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), com a incrementação da produção de alimentos a partir do financiamento de iniciativas com menos emissões de gases do efeito estufa.
Na comparação com 2023 – os últimos quatro meses terminados em outubro -, segundo o ministro, os resultados já podem ser notados.
“Aumentamos em 28,5% o financiamento para a agricultura orgânica e agroecológica em uma redução de 23,7% para a agricultura transgênica. Nós também tivemos um crescimento de 20% em máquinas, equipamentos e implementos – R$ 6,3 bilhões no financiamento de máquinas para o pequeno agricultor. Tivemos um crescimento na produção de feijão, cebola, batata, repolho, cenoura e uma redução na produção de soja na agricultura familiar de 14%”, detalhou.
Junto com o Centro Agronômico Tropical de Pesquisa e Ensino (Catie) e RCC Caribbean – organização criada na estrutura da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança Climática para dar apoio aos pequenos estados insulares, particularmente mais vulneráveis às mudanças climáticas – o IICA também realizou, pela primeira vez, um painel dentro da programação oficial de abertura da COP29.
Com o título Adaptação pela Abordagem de Soluções Baseadas na Natureza para Medir a Vulnerabilidade e os Riscos na Região da América Latina e Caribe, o encontro debateu como tornar a agricultura mais sustentável e resiliente às mudanças climáticas.
“O que nós queremos é ter sustentabilidade. Essa sustentabilidade só acontecerá se tivermos uma visão de transformar o setor produtivo agrícola brasileiro e isso não vai acontecer por geração espontânea. Isso vai acontecer com uma estratégia de políticas públicas e de financiamento, que viabilize essa transição”, afirmou o ex-diretor geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), Roberto Azevedo.
Para ele, a criação de um marco regulatório com diversos instrumentos que recompensem financeiramente os investimentos na transição para a economia verde é uma forma de tornar o setor mais comprometido com formas de produção sustentáveis.
“Se você tem um sistema regulatório que prevê uma remuneração mínima, uma indexação do preço do produto final, uma mistura no combustível final que atende a um determinado patamar, todos esses elementos são pequenos e parecem independentes, mas não são. Dependendo do marco regulatório que você cria, o investidor vai fazer a transformação por ser interessante para ele”, explicou.
Roberto Azevedo acrescentou que tal estrutura serviria como uma complementação aos subsídios e financiamentos estatais.
“Eu particularmente não acredito que o incentivo tenha que ser sempre uma despesa do Estado. Porque o Estado não terá dinheiro. Sobretudo em países da região – Brasil, Argentina – não são países com um orçamento infinito. Essa transição tem que ser feita de forma inteligente, com um marco regulatório que ajude e promova, incentive [para que] o investimento venha do próprio produtor”, explicou.
Na viabilização da descarbonização da agricultura, Azevedo aponta ainda outro elemento complementar para as formas de financiamento que seria o desenvolvimento tecnológico do setor.
“Quando se fala de sustentabilidade, a tecnologia e a inovação têm um papel importantíssimo e elas estão mudando dia a dia. O que hoje é sustentável não é que vai passar a não ser. Você encontrará métodos de produção, tecnologias mais modernas que vão melhorar e acelerar essa transição. Então, não é um processo estático, é um processo dinâmico. A cada momento, a cada dia, aparece uma nova inovação, uma nova forma de produção”, acrescentou.
COP30 em Belém
Segundo Manuel Otero, além da troca de experiências, a IICA também trabalha para criar conexões entre as pessoas que podem promover essa transformação da agricultura. Uma reunião com o governador do Pará, Helder Barbalho, que receberá a COP30, em 2025, em Belém, também buscou alinhar, em Baku, as agendas para que o próximo encontro da Junta Interamericana de Agricultura, com os 34 ministros da Agricultura nas Américas, a cada dois anos, seja realizado em Belém, na agenda pré-COP.
Segundo Otero, acelerar a transição é uma urgência que deve ser compreendida pelo setor e fundamentada no bem-estar das próximas gerações. “O IICA se considera uma instituição construtora de pontes. Temos que fortalecer as pontes entre o agro e o meio ambiente, entre as cidades, as zonas rurais. Então, pequenos agricultores e médios produtores, grandes produtores, todos temos que ir atrás da causa do desenvolvimento sustentável. Todos, e ninguém pode ficar de fora, ninguém pode ficar para trás”, conclui.
Para o governador paraense, a proximidade do setor da agricultura com a pauta ambiental trará novas oportunidades para acelerar a transição em direção a uma economia mais sustentável.
“O uso da terra representa 96% das emissões em território paraense. Portanto, trabalhar para que haja um melhor uso da terra certamente está dentro das estratégias centrais para que o Pará possa reduzir as suas emissões”, disse.
Por Agência Brasil