A Grande Ópera do Centro Cultural 25 de Julho
Frequentar o Centro Cultural 25 de Julho no município de Erechim/RS, na Rua Gaurama de nº 210, é vivenciar dentro de si um festival de emoções que acontece unicamente por permitir com que a cultura do outro entre na minha. Depois da reinauguração então, é um espaço de boa acústica e iluminação, com equipamentos inovadores (alguns funcionais, outros já nem tanto).
Ópera é um gênero artístico dramático-musical, ou seja, um espetáculo que envolve música, drama e pode ser que haja diálogo[1], afinal, uma ópera não pode ser realizada sozinha, precisa de mais participantes. Devem acontecer algumas óperas durante o ano neste espaço, mas não é nesse sentido que vos falo, não falaremos aqui da literalmente ópera.
Quando eu era muy pequeña, minha família sempre fazia questão que eu habitasse o Centro Cultural, pois é importante que los pequeños participem desse espaço desde cedo. Falavam-me “se arruma bem, naquele lugar a gente não pode ir de qualquer jeito” e eu me perguntava que lugar é esse que não dá pra vestir qualquer tipo de roupa… Não dava pra usar chinelo, nem bermudinha, nem camisa dos personagens que eu gostava, tinha que ser “elegante”. Também, sempre que pergunto a alguém mais velho sobre o assunto, sempre dizem sobre ternos, sapatos e vestidos de grife. Não sei se isso tem um conhecimento registrado em nosso arquivo histórico, mas com certeza, é uma historiografia oral dos moradores mais velhos que frequentavam o espaço.
O que mais será que não dava pra vestir? Será que a 40 anos atrás a pessoa de pele negra entrava? será que expressões de comunidades que se não as alemãs (no qual o próprio nome do Centro Cultural às homenageia enquanto povo)[2], italianas e polonesas eram reconhecidas? Quem, afinal, têm um diálogo no roteiro desta ópera chamada Centro Cultural 25 de Julho e participa dela? Esta é a ópera que me refiro e interpreto que Coward, autor da frase do começo desse texto coloca como problema: A ópera da exclusão, desigualdade e não reconhecimento da cultura popular é o que sempre foi, e este é o problema.
Ao longo dos 40 e poucos anos de história do espaço, essa ópera vem mudando juntamente com os participantes: o Centro Cultural se abre para as mais diversas expressões artísticas, contando com a participação das tantas comunidades presentes na região, das diversas etnias, gêneros, orientações, cores e classes, a cultura popular entra e podemos ver um movimento de reconhecimento desta, assim como da cultura erudita.
Em uma aula da Educação de Jovens e Adultos (EJA), isso no Rio Grande do Norte, o Professor Jomard Muniz diz que a cultura para o ser humano é o impulso criador dos homens e das mulheres, a necessidade de fazer algo, expressar-se comunicar-se, exprimir-se, seja uma panela de barro, seja um relógio[3]. Para o professor, que apoia-se em Paulo Freire para dizer a palavra, cultura popular é uma cultura de subsistência, que surge diretamente do esforço criador do povo, dos oprimidos, já a cultura erudita é conhecida como a cultura “intelectual”, unicamente da elite e dos homens e mulheres considerados(as) cultos(as), dos opressores. Em síntese, o professor deixa uma reflexão necessária: tanto a cultura popular quanto a erudita precisam de uma ponte, uma democratização cultural, visto que ambas as culturas provém de homens e mulheres cultos(as), não há saber maior ou menor, apenas saberes e culturas diferentes.
Entre aspas
A concepção do que é cultura sempre foi permeada de disputas no campo da Educação e da Cultura, a existência dessa dualidade e quase bipolaridade (pois parecem dois pólos distantes) entre a cultura popular e a erudita cria mais dicotomia ainda. Porém, podemos ver laços entre as duas na região: as classes populares conseguem a partir do Belas Artes tocar piano, violino, técnicas visuais, ballet (artes que são predominantes na Europa), enquanto os jovens das elites podem ter acesso ao rap, hip-hop e grafite. Essa comunicação entre as duas partes faz diferença, o que fica claro quando percebemos a expressão artística nas olimpíadas na França 2024, “Ballet x Hip-hop”, no qual um homem negro dançarino de hip-hop e uma mulher branca bailarina dançam juntos uma música em sintonia.
Kaylani Dal Medico.
Discente do Curso de Licenciatura em Pedagogia da UFFS Erechim.
Bolsista do Projeto de Extensão “Dizer a sua palavra”: democratização da cultura popular e da comunicação
kaylanidalmedico@hotmail.com
[1] BRANDÃO, José Maurício. Ópera no Brasil: um panorama histórico. Revista Música Hodie, v. 12, n. 2, 2012, p. 31-47. Disponível em: https://revistas.ufg.br/musica/article/view/22543/13403
[2] Prefeitura Municipal de Erechim. Erechim 90 Anos – Noite de festa marcou os 25 anos do Centro Cultural 25 de Julho. Disponível em:
[3] Transcrição da fala do ProfessorJomard Muniz, documento da Secretaria de Estado de Educação e Cultura (Natal, 11 de junho de 1963) Disponível em: https://acervoapi.paulofreire.org/server/api/core/bitstreams/09a90e06-e72d-482d-888f-e299bcd6076f/content