Em defesa da escola
I
Eu gosto da escola. Quem não concorda, pode me apresentar argumentos, pode me mostrar exemplos, pode até me chamar de corporativista. Tudo bem, eu aceito e reafirmo: a escola é um lugar em que vale a pena estar. Ah, mas que coisa ingênua! Ih, lá vem mais um professor universitário defender a educação! Exatamente isso: em meio às suas contradições, considerando todos os seus problemas, suas opressões, padronizações, enfim, tudo aquilo que deveria e não acontece, bem, mesmo assim, a escola é um lugar especial. Caras leitoras, caros leitores, sabem por que a escola me mobiliza em sua defesa? Por que ela é feita de gente. Não é em qualquer lugar que encontramos tanta alegria junto com tristezas, que vemos a solidariedade ao lado de práticas violentas, que, ao fim e ao cabo, encontramos a humanidade em sua mais original representação.
II
A pior coisa é sermos indiferentes à escola. Para algumas pessoas, tanto faz como tanto fez se tem ou não tem aula, se a BNCC vai vigorar ou não, se funcionárias(os) são bem pagas(os) e respeitadas(os). Prefiro aquelas e aqueles que odeiam a escola, pois, exatamente por isso, possuem a capacidade latente de amá-la. O amor e o ódio são afetos relacionais. Ser indiferente à escola é não se importar com a vida – a sua e a das outras pessoas. A escola é uma construção histórica e, como tal, sujeita a grandes disputas políticas que, no fundo, respondem a seguinte questão: que tipo de ser humano queremos formar?
Ao nos importarmos com a escola, estamos nos vinculando a um projeto de sociedade, um projeto de Estado. Estamos tratando do presente e do futuro. Estamos reconhecendo que não nascemos prontos(as), que precisamos nos educar e que aprender é algo extraordinário e complexo. Há uma beleza no processo de alguém aprender algo e desenvolver a capacidade de ensinar esse algo aprendido a outra pessoa. E tudo isso permeado por tensões, escolhas e diferentes interpretações. Por isso, ser professor(a) é ocupar um lugar de muita responsabilidade, que exige formação científica e muita, mas muita sensibilidade. No exercício da docência exercitamos nossa humanidade, nos reconhecendo como cientistas e, de certa forma, artesãs e artesãos. Ou agricultoras(os) que semeiam a terra em busca de seus frutos.
III
A escola tem sua burocracia, tem suas teorias, suas práticas, tem suas lacunas, seus excessos, suas gincanas, suas feiras do livro, suas festas juninas e julinas, seus campeonatos e formaturas. Tem a prova, o trabalho, o seminário, a viagem de estudos. Tem a nota, a aprovação, a reprovação e a evasão. Na escola tem merenda, tem bar, tem uniforme e tem palestra. Tem a professora simpática, tem o professor chato e tem a entrega de boletim. Tem tanta coisa que, quando termina nosso tempo lá, começa um período de saudades. Eu luto pelo direito (ainda não garantido de fato) de todos e todas em nosso país sentirem saudade da escola. É condição da saudade a experiência, mas, considerando o que representa a escola, podemos entender que há crianças, jovens e adultos que podem sentir saudade até mesmo da escola que não foram ou ficaram pouco tempo.
IV
Não tem apenas um jeito de escola. Mais do que escolas públicas e privadas, temos escolas gaiolas e escolas pássaros. Com inspiração em Rubem Alves e Paulo Freire, entendo a escola como um lugar de criação, de liberdade, de ousadia e descobertas. Aprendemos conteúdos e ressignificamos nosso cotidiano nesse lugar coletivo. Por isso, a escola deve ser um espaço plural, acolhedor do(a) diferente e das diferenças. Ora, em um lugar assim é de se esperar a contradição, a tensão, o enfrentamento e a disputa. Não precisamos pensar da mesma forma, ver o mundo com as mesmas lentes, mas, talvez seja interessante entender e respeitar a escola como esse lugar do colóquio. E isso não significa apenas conversas soltas, mas, sob a orientação de profissionais formados(as), o processo formativo deve também produzir sínteses, indicar caminhos, propor alternativas e produzir novas questões.
V
Por todas essas potencialidades, defender a escola deveria ser a tarefa cidadã número um. Não uma defesa ingênua, mas uma defesa crítica, que aponte os erros, corrija rumos e inove. Falar mal da escola e de suas gentes (estudantes, educadores(as), funcionários(as)) é muito fácil. Quero ver estar lá todos os dias. Uma das melhores formas de defender a escola é respeitar a instituição e, sobretudo, suas gentes. Se não está bom com a escola, imagine sem ela?
Curiosidade
Uma provocação: tu tens curiosidade em relação aos planos dos(as) candidatos a cargos políticos esse ano acerca da escola? Penso que vale a pena nos apropriarmos disso. Qualificar nosso voto é fundamental.
Compartilhando leituras
Recentemente esteve na UFFS Erechim o educador português José Pacheco, conhecido como Zé da Ponte. Ele contribuiu na construção do projeto “Escola da Ponte” em Portugal. Para conhecer sobre esse jeito de fazer escola a partir do texto poético e filosófico do educador brasileiro Rubem Alves, sugiro o livro “A escola que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir”.
Por Thiago Ingrassia Pereira